NO FUTEBOL COMO NA VIDA
«A bola é como a vida. Não é a nossa vida. Mas, sendo um jogo apaixonante, que nos enche de alegrias e decepções, reproduz em traços fortes o mundo em que vivemos. Na grandeza do jogo e na miséria por de trás dele. Os ricos da bola são como os ricos de todo o lado: suficientemente gananciosos para não perderem um pouco dos milhões que nem sabem como gastar e, como todos nós, pagarem os seus impostos. Apenas são mais imprudentes. A ponto de arriscarem a sua liberdade. Os jogos de poder da bola são como os jogos de poder em todo o lado: os mais fortes aprovam leis severas para os outros e benevolentes para si mesmos. Apenas são mais provocadores. A ponto de considerarem mais perigoso um cigarro electrónico do que uma claque ilegal. A corrupção no futebol é como a corrupção em todo o lado. Apenas mais descarada. A ponto de se escrever em e-mails o que nem no telemóvel se costuma sussurrar. Os ciclos no futebol são como os ciclos da vida: as coisas começam, ganham forma e chegam ao fim.
Como colunista sempre tive duas regras: não escrevo para grupos de comunicação, escrevo para jornais; não sou um colunista de um clube ou de um partido, sou um colunista que tem um clube e tinha um partido. Não escrevo para grupos de comunicação social porque acredito que os jornais são dirigidos por jornalistas, não por empresários. E no Record sempre tive a liberdade para escrever tudo o que queria. Isso chega-me. Quanto à segunda regra, tive de a explicar a dois presidentes do meu clube que me pediam para "unir forças": sou um colunista sportinguista, não sou um colunista do Sporting. Não transmito recados, não repito cartilhas, não ponho um cachecol sobre a minha consciência. Nos sete anos que leva esta coluna não terei dado grandes ajudas tácticas a treinadores nem brilhantes ideias para contratações. Mas, numa área onde isso é menos habitual do que devia ser, fiz tudo para defender uma cultura de independência. Sou sportinguista e sempre o sublinhei. Apoiei uns presidentes e não apoiei outros, dos vários que se sucederam na direcção do meu clube enquanto aqui escrevi, e nunca o escondi. Mas sei que nunca fui lido, nem por aqueles que de mim discordam, como porta-voz de ninguém. Não é virtude, é feitio.
Quando, há sete anos, o Bernardo Ribeiro me convidou para escrever no Record comecei por recusar. Estava fora da minha zona de conforto. Pelo desafio, acabei por aceitar. No futebol como na vida, espero ter estado à altura. Pelo menos orgulho-me de ter passado por este estranho mundo com a coluna intacta e a cabeça sã. Não é tarefa fácil. A minha aventura no Record acaba aqui. Este ciclo chegou ao fim. Foi um prazer estar convosco.»
(Daniel Oliveira, Verde na bola, in Record)
Ainda estou prostrado no chão com o "upper-cut" com que Daniel Oliveira, talvez sem sequer o imaginar, acaba de me derrubar. Tenho medo do que aí virá, depois desta surpreendente e triste retirada de um dos melhores cronistas que me lembro de ter visto passar pelo meu jornal de sempre: o Record!...
Mas se querem que me confesse, de forma frontal e de alma lavada como tentei ser em toda a minha vida...
Tenho medo do que aí virá, porque jornalistas com esta grandeza, inteligência, verticalidade e frontalidade não abundam neste rectângulo em que vive e tenta ser feliz um "povo que nem se governa nem se deixa governar"!...
Apanhei como cidadão livre e pensante e sem culpa alguma, pelo lombo abaixo, com 28 anos de ditadura fascista! Depois como adepto de futebol e sportinguista, tive a desventura de não ter assistido como adulto consciente, ao apogeu do meu Sporting e dos seus "Cinco Violinos", para ser confrontado apenas com as mafiosas hegemonias de outros clubes e assisti angustiado a sucessivas quebras de recordes sem celebrar o título de campeão. Mas tive o privilégio de sentir ao meu lado pessoas da estirpe de Daniel Oliveira, com quem aprendi a partilhar desgostos e decepções, sempre com elevação, "fair play" e... esperança!...
Agora tenho medo que não seja de novo Bernardo Ribeiro a fazer o convite para sarar esta "ferida aberta" com o abandono de Daniel Oliveira...
Estou farto de hegemonias mafiosas e jornalismo subserviente!...
Leoninamente,
Até à próxima
"Azar do record...fecha-se uma janela por onde entrava e saia liberdade..."
ResponderEliminar"Ficámos a perder"...
Nunca mais vamos ver à janela "a secar...a liberdade de DO..."...
"A rua fica mais triste...sem a cor da liberdade..."...
SL
E com isto se despacham dois cronistas isentos (um do Benfica e outro do Sporting).
ResponderEliminarPara os substituir, um encartilhado e um lambe botas?
Toca a prender essa gente...
ResponderEliminarAnda ali um trafego de emails para os lados de Carnide que é impressionante...
Padres, missas, Primeiro ministro, nosso amigo Mota, o menino querido, carne toda no assador... Parece uma novela mexicana O:)
Olhe a tensão, Alamo. Assim não dura até aos 200 anos. Deixe lá isso. Para o ano há mais futebol.
ResponderEliminarUm comemtário meu sobre o DO só pode ser curto. Tudo o que dele li foi aqui no Leoninamente e nos poucos anos de pessoa adulta que vivi em Portugal nunca li nem o Record, nem A Bola, e... O Jogo ainda não existia. Gostei de tudo o que li e, pela fotografia, cheguei a pensar que o tinha conhecido pessoalmente com um erro tremendo de confusão com um indivíduo natural da Madeira. Terão passado algumas semanas sobre um Prós e Contras em que ele esteve presente e em que desfiz por completo essa confusão. Hoje pela Wikipedia certifiquei-me da data (Julho 1967) e local de nascimento (Lisboa) e posso afirmar que ele nem 10 meses tinha de idade quando eu dei o "salto,. salto esse que fez com que eu tivesse levado pelo lombo abaixo menos anos de fascismo que o nosso Álamo. Recentemente fiquei com a impressão que também PSG se despedia da sua coluna no Record. Tudo isso me atrista (entristece) mas não será a morte do artista. Já agora eu ainda vi jogar o José Travassos no Porto (Antas ou Bessa é que já não me lembro já que nunca entrei no campo do Salgueiros!)
ResponderEliminarO interessante e agradável comentário do meu amigo Aboim Serôdio, que desde já agradeço, atendendo ao afastamento do amigo deste cantinho há tantos anos, sugeriu-me que, abusando da sua bondade e compreensão, lhe faça chegar a informação sobre algo mais acerca de Daniel Oliveira: era filho de Herberto Helder (de Oliveira), muito provavelmente, "o maior poeta português da segunda metade do século XX", desaparecido em 23 de Março de 2015, em Cascais, onde residia ultimamente.
EliminarDO foi um dos fundadores do Bloco de Esquerda de que se afastou há alguns anos e terá sido depois um dos impulsionadores do Congresso Democrático das Alternativas, que teve por objectivo ser a génese de um novo movimento político e que acabou por fenecer e ser extinto, precisamente há um ano, que se completará amanhã, 16 de Junho, desconhecendo eu se será sua intenção abalançar-se a um qualquer novo projecto político. Continuaremos a beber do seu saber, inteligência, cultura e grandeza de carácter, através da sua participação no programa "Eixo do Mal" da SIC-Notícias, que vai para o ar aqui em Portugal aos domingos, às 00:00 horas.
Com amizade, abraço e SL
Não tens vergonha corrupto 80?lampião corrupto,metes nojo.
ResponderEliminarAgradeço ao Leoninamente, blogue que acompanho religiosamente há anos, a forma séria como foi acompanhando o que escrevo. Abraços e saudações leoninas.
ResponderEliminarNão assinei: Daniel Oliveira
EliminarObrigado, Daniel. Mas permita que lhe expresse, agora directamente, o meu pesar pelo sua "fuga". Não sei como conseguirei prosseguir sem "farol". Mas o leão está habituado a levantar-se sempre que tropeça e por este tropeção não estaria eu à espera. Mas a vida continua. Eu também continuarei a acompanhá-lo, religiosamente como há muitos anos, no Eixo do Mal. Até sempre, camarada. Grande abraço e Saudações Leoninas.
EliminarTambém lamento, mas as coisas são assim. Continuem o vosso trabalho que tantas vezes me ajudou a pensar.
EliminarDaniel, o seu perfil identificou-o cabalmente. Obrigado mais uma vez, pela honra que me deu o seu comentário.
EliminarOutra vez ainda, o meu sentido obrigado Daniel. Leoninamente é um esforçado trabalho singular, que em cada dia ofereço com satisfação aos sportinguistas. Mas creia que com a sua assiduidade no jornal Record, o maior beneficiado e aquele que mais foi ajudado a pensar, terei sido eu, sem a mais pequena réstia de dúvida. A minha homenagem e gratidão por ser como é!...
EliminarDaniel, só eu sei o quanto lamento a suspensão da sua crónica. Mas compreendo que as coisas sejam como são. Continuarei o meu trabalho, mas se me achar merecedor de uns minutos da sua atenção, ao fundo da página do blog, do lado esquerdo, está o meu contacto. Seria um privilégio, poder colocar-lhe uma questão simples, que esta via de todo não recomenda. Faça-o pelo Sporting. A questão tem a ver com o "nosso grande amor". Antecipadamente grato.
E se o nosso consócio DO...nos momentos em que espera "ir para o ar...no Eixo do Mal"...
ResponderEliminarNos "visitasse"...e fosse deixando uns "apontamentos"...?
Boa saúde para ele...e obrigado pelas óptimas crónicas com que nos foi brindando...
SL