O Sporting e as claques no país do faz-de-conta
O tema das claques, que ganhou um novo élan com a tomada de posição do actual Conselho Directivo do Sporting e do seu presidente, Frederico Varandas, está a ser discutido da pior forma ou, melhor dizendo, não está a ser analisado no contexto e na dimensão exactos.
1. Há uma corrente de opinião, sustentada por um lado no interesse da manutenção das mordomias e dos negócios de duas claques do Sporting e, por outro, na motivação de franjas oposicionistas cujo maior interesse é chegar ao poder, seja lá por onde for, que vê o posicionamento de Varandas como uma espécie de bóia de salvação, considerando o fraco desempenho da equipa de futebol, no primeiro ano de ‘autonomia varandista’, com treinador e jogadores escolhidos no âmbito da sua administração e consulado.
2. Não se pode misturar as coisas e é perigoso misturar as coisas. Há anos que o tema das claques foi abandonado e, por causa desse abandono, as claques foram ganhando— junto dos clubes, de Norte a Sul — um poder inusitado e, repito, perigoso. Esse poder foi sendo consolidado com a total indiferença e cumplicidade das tutelas.
3. Toda a gente se lembra, no auge do processo ‘Apito Dourado’, das imagens do presidente do FC Porto à chegada ao tribunal rodeado de ‘seguranças’ da principal claque dos azuis-e-brancos.
4. Mais recentemente o que aconteceu na Academia do Sporting, cuja invasão ocorre na sequência de um clima e de uma linguagem bélicas usadas pelo ex-presidente, inclusive contra a própria equipa e jogadores, colocou o tema das claques num patamar de perigosidade nunca antes visto.
5. Não cedendo aos caprichos das ditas claques e não alimentando as suas mordomias e negócios, o presidente dos ‘leões’ expôs-se como nunca. As ditas claques foram engordando e inchando ainda antes do ‘fenómeno’ Bruno de Carvalho (todos nos lembramos das problemáticas do eixo Godinho Lopes-Pereira Cristóvão), mas foi com ele que adquiriram a expressão máxima da influência e do peso na estrutura.
6. Um presidente entrar, recorrentemente, no relvado para, junto do sector das claques, fazer vénias de agradecimento pelo ‘apoio’ prestado foi mais uma das singularidades achadas no tempo mais lamentável da história do Sporting.
7. Quer dizer: para poderem ter o conforto da ‘segurança’, ou lá o que isso representa, e a disponibilidade dos ‘braços armados’, os presidentes de clubes representativos do futebol nacional como o FC Porto e o Sporting, em momentos e épocas diferentes, não se importaram de trocar esse apoio pela perda de autonomia e poder.
8. Quando, em Abril deste ano, o FC Porto foi a Vila do Conde empatar e hipotecar a réstia de esperança que ainda havia na reconquista do título, a humilhação sofrida por jogadores, treinadores e administradores correspondeu à cedência mais indigente e invertebrada que uma estrutura (supostamente forte) poderia protagonizar.
9. Isto anda tudo de pernas para o ar, completamente subvertido. E, repito: os clubes e os seus responsáveis alimentaram e acomodaram-se a um regime que é uma afronta a qualquer sociedade civilizada.
10. E ‘isto’ aconteceu debaixo do nariz do Estado, com claques organizadas ou não, sendo que em Portugal estar legalizado ou não estar legalizado vai dar ao mesmo. Ao mesmo regime genericamente de impunidade, perante a ameaça, o desrespeito — perante princípios basilares de urbanidade — e a violência.
11. O tempo que leva a amassar legislação e a criação de organismos de suposta Autoridade — a ineficácia tem sido (até agora) brutal. Conversa de chacha.
12. Vamos ser claros: os clubes dominantes e os governos andam a fazer pouco daqueles que não se revêem neste tipo de processos. Se quisessem acabar com isto, já o tinham feito. Hoje, há mecanismos fáceis de accionar segundo os quais qualquer espectador que se sente num determinado lugar dos estádios é potencialmente identificável.
13. Esta coisa-chique dos GOA torna a subversão ainda mais indigna, porque é legitimada. Pagar e financiar o apoio para quê? Deixem o livre arbítrio de puxar pelas equipas aos adeptos. Adeptos comuns. Adeptos sem agenda. Adeptos que apenas querem ver o seu clube ganhar e saibam aceitar a derrota.
14. Dá mais trabalho às polícias e uma concertação maior entre Ministérios? Sim, mas o poder político não pode continuar a fazer de conta. Este problema não é só do Sporting; é do FC Porto e do Benfica — e é do País.
15. O poder político tinha a obrigação de acabar com as claques, quando elas exorbitaram o objecto da sua existência. É muito difícil de entender a passividade de António Costa e até de Marcelo Rebelo de Sousa, perante este desfile de indignidades. Ou talvez não.»
(Rui Santos, Pressão Alta, in jornal Record, hoje às 18:58)
Ele há tantas coisas difíceis de entender...
Ele há tantas coisas difíceis de entender...
Nesta cândida aldeia que somosl!...
Leoninamente,
Até à próxima
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