Era uma vez uma águia que foi criada num galinheiro. Cresceu pensando que era galinha. Era uma galinha estranha, e isso fazia-a sofrer. Que tristeza quando se via reflectida nos espelhos das poças d’água. Tão diferente! O bico era grande demais, adunco, impróprio para catar milho, como todas as outras faziam. Seus olhos tinham um olhar feroz, diferente do olhar amedrontado das galinhas, tão ao sabor do amor do galo.
Era muito grande em relação às outras, era atlética. Com certeza sofria de alguma doença. E ela queria uma coisa só: ser uma galinha comum, como todas as outras. Fazia um esforço enorme para isso. Treinava insinuações com bamboleio próprio. Andava meio agachada, para não se destacar pela altura. Tomava lições de cacarejo. O que mais queria: que seu cocó tivesse o mesmo cheiro familiar e acolhedor do cocó das galinhas. O seu era diferente, inconfundível. Todos sabiam onde ela tinha estado e riam.
Era muito grande em relação às outras, era atlética. Com certeza sofria de alguma doença. E ela queria uma coisa só: ser uma galinha comum, como todas as outras. Fazia um esforço enorme para isso. Treinava insinuações com bamboleio próprio. Andava meio agachada, para não se destacar pela altura. Tomava lições de cacarejo. O que mais queria: que seu cocó tivesse o mesmo cheiro familiar e acolhedor do cocó das galinhas. O seu era diferente, inconfundível. Todos sabiam onde ela tinha estado e riam.
A sua luta para ser igual levava-a a extremos de dedicação política. Participava de todas as causas. Quando havia greve por rações de milho mais abundantes, ela estava sempre na frente. Fazia discursos inflamados contra as péssimas condições de segurança do galinheiro, pois a cobertura precisava ser reparada, estava cheia de buracos. Nunca lhe passou pela cabeça aproveitar-se dos furos para fugir, porque o que ela queria não era a liberdade, era ser igual às outras, mesmo dentro do galinheiro.
Pregava a necessidade de uma revolução no galinheiro. Acabar com o dono que se apossava do trabalho das galinhas. O galinheiro precisava de nova administração galinácea. Acabar com o galinheiro, derrubar as cercas, isso era coisa impensável. O que se desejava era um galinheiro que fosse bom, protegido, onde ninguém pudesse entrar – muito embora o reverso fosse “de onde ninguém pudesse sair”.
Aconteceu que, um dia, um alpinista que se dirigia para o cume das montanhas passou por ali. Alpinistas são pessoas que gostam de ser águias. Não podendo, fazem aquilo que mais se aproxima: sobem a pés e mãos, até às alturas onde elas vivem e voam. E ficam lá olhando para baixo, imaginando que seria muito bom se fossem águias e pudessem voar.
O alpinista viu a águia no galinheiro e se assustou.
- O que estás tu, águia, a fazer no meio das galinhas?!...
Ela pensou que estivesse sendo gozada e ficou brava.
- Não me gozes. Águia era a tua avó. Sou galinha de corpo e alma, embora não pareça.
- Galinha coisa nenhuma, replicou o alpinista. Tu tens bico de água, olhar de águia, rabo de águia, cocó de águia. És ÁGUIA. Deverias estar voando… E apontou para minúsculos pontos negros no céu, muito longe, águias que voam perto dos picos da montanha.
- Deus me livre! Tenho vertigem das alturas. Dão-me tonturas. O máximo, para mim, é o segundo degrau do poleiro.
O alpinista percebeu que a discussão não iria a lugar nenhum. Suspeitou que a águia até gostava de ser galinha. Coisa que acontece frequentemente. Voar é excitante, mas dá calafrios. O galinheiro pode ser chato, mas é tranquilo. A segurança atrai mais que a liberdade. Assim, final de conversa. Agarrou a águia e enfiou-a dentro de um saco. E continuou sua marcha para o alto das montanhas.
Chegando lá, escolheu o abismo mais fundo, abriu o saco e sacudiu a águia no vazio. Ela caiu. Aterrorizada, debateu-se furiosamente procurando algo a que se agarrar. Mas não havia nada. Só lhe sobravam as asas.
E foi então que algo novo aconteceu. Do fundo de seu corpo galináceo, uma águia, há muito tempo adormecida e esquecida, acordou, valeu-se das asas e, de repente, voou. Lá de cima olhou o vale de onde viera. Visto das alturas ele era muito mais bonito. Que pena que há tantos animais que só conseguem ver os limites do galinheiro!
Adaptação - Álamo
"... Diz-nos a História, que todos os impérios e civilizações acabaram por cair! O pantanal está moribundo! Os caudilhos começam a provar a sopa de lentilhas com que alimentaram a plebe. Hoje um! Amanhã será outro!
No planalto, os leões vivem felizes e acreditam no Futuro! Agora no planalto, é Primavera"! E talvez um dia, possamos ver águias cruzando os céus e todos os outros animais, em liberdade e harmonia, cumprindo os preceitos sagrados da Mater Natura!...
Leoninamente,
Até à próxima
Pois é amigo Álamo, há animais que só são felizes com uma visão reduzida....desconhecem totalmente a beleza que existe para lá do galinheiro...é uma pena mesmo, mas como estão acomodados ao conforto do seu espaço, não ousam sequer ver mais longe....mas suspeito que não virão longe os dias, em que estes animais criarão novos hábitos...
ResponderEliminarAbraço Leonino
Eu já nem digo nada amiga Maria. Passei longo tempo a apreciar o meu canário, com a porta da gaiola aberta! Nunca fugiu, coitadito. E acabou por esticar o pernil, dentro da gaiola !...
EliminarAbraço Leonino
"...E foi então que algo novo aconteceu. Do fundo de seu corpo galináceo, uma águia, há muito tempo adormecida e esquecida, acordou, valeu-se das asas e, de repente, voou. Lá de cima olhou o vale de onde viera. Visto das alturas ele era muito mais bonito. Que pena que há tantos animais que só conseguem ver os limites do galinheiro!
ResponderEliminarUma só coisa lhe dava saudades e lhe entristecia o olhar, e isso acontecia, sempre que se lembrava, do momento em que a dona do galinheiro queria ver...se ela tinha ovo...!
Desculpe o amigo Álamo o meu atrevimento, em acrescentar este último parágrafo...
SL
Ai amigo Max, essa não lembrava ao diabo! Coitada da águia, se as mãos da dona forem do tamanho das do dr. Pericão, ilustre urologista de Aveiro!...
EliminarSL