Tomaz Morais: «Sporting tem sido adversário de si próprio»
Aos 49 anos, o antigo seleccionador nacional de râguebi regressou a Alvalade para coordenar o novo Gabinete de Formação Interna e Liderança
«RECORD: Esteve no Sporting entre 2006 e 2007 e hoje volta para coordenar o novo gabinete de formação interna e liderança. A experiência anterior foi um ano de aprendizagem?
TOMAZ MORAIS – Foram tempos óptimos. Na altura achavam que o Sporting precisava de rever processos e interligar sectores, como o futebol de formação e profissional, e acima de tudo ter um facilitador que pudesse meter as pessoas a pensar em conjunto, e não individualmente. Foi o que fiz. Não estava a full-time e, como seguia ligado a uma das minhas outras paixões, o râguebi, senti que não estava a conseguir oferecer a energia que queria e saí.
R: Como foi feito o contacto do presidente Frederico Varandas?
TM – Tivemos um belíssimo primeiro contacto. Acho muito respeitáveis as pessoas que se candidatam à presidência do Sporting. Logo, como quero ouvir e aprender, se dizem que querem conversar comigo não posso dizer que não. Aconteceu com Godinho Lopes e com outras direcções daí para a frente. Quando participo num projecto gosto de entrar no momento certo, onde se possa fazer a diferença. Foi esse o ‘feeling’ que tive com este convite - e também porque me revejo nos profissionais que o Sporting tem. O presidente soube transmitir-me muito bem o que queria de mim e deu-me abertura para apresentar ideias. Aberto, humilde e simples.
R: Está no cargo há três meses. Que trabalho ‘palpável’ tem feito?
TM - O meu trabalho é invisível [risos]. Quanto mais for, melhor será. Tenho tarefas de ‘backoffice’, que ajudam ao que o presidente me pediu: sermos mais fortes na identidade, cultura e valores. É um gabinete que funciona como suporte a todas as modalidades e também ‘virado’ para a Academia.
R: Há falta de cultura e valores no Sporting actual? É um problema?
TM - Os valores estão sempre presentes. O presidente conhecia bem a casa. Quando montou o seu plano estratégico, uma das coisas que me vincou é que não quer só formar jogadores, mas também homens para vida. Revejo-me totalmente.
R: Frederico Varandas encaixa na sua definição de um líder? Ou tem ainda a aprender?
TM - Tem! Tenho aprendido imenso com o presidente. Um líder jamais tem de ser uma pessoa demasiado autoritária. Não é a hierarquia que o define, mas sim o que tem dentro de si. Tenho gostado muito de trabalhar com o presidente, posso dizer que foi uma surpresa. Tem ideias firmes e uma cultura que quer partilhar. Dá muita responsabilidade individual a todos, as pessoas podem crescer com ele. A liderança partilhada pode dar grandes resultados. Mas quando é preciso tomar decisões, para dentro ou para fora, é ele quem dá a cara. A primeira característica que vi no presidente foi a capacidade de ouvir. É a melhor que qualquer líder pode ter, não é falar.
R: É um corte com o passado?
TM - São lideranças completamente diferentes. Do que via de fora, a anterior era mais virada para si mesma. O que tenho visto no presidente actual é uma liderança muito virada e preocupada com os outros.
R: Recentemente, a Academia recebeu uma reunião interna, com mais de 300 colaboradores, mediada por si. É um evento especial tendo em conta o ataque à Academia e o passado verão turbulento?
TM - Foi ideia deste gabinete. Estes eventos são sempre importantes, com ou sem esse dia. A visão que o Sporting tem vem de José de Alvalade e para mim é intocável. E para dar corpo a essa visão havia que repensar os valores e pilares em que o Sporting assenta. Explicámos aos colaboradores o que é esperado deles. Foi um dia único, depois soube até que nunca tinha sido feito.
R: Disse que "quem define metas sem ter a certeza de que tem meios para as concretizar, está no mau caminho". O Sporting tem os meios necessários para ser campeão?
TM - Estão a ser criados. Se não haviam? Não tenho conhecimento do passado, só posso olhar para o futuro. Temos de criar um ambiente favorável para potenciar jogadores, metê-los a jogar na equipa principal e conquistar títulos. O Sporting tem um grande problema: a estabilidade. Para vencermos precisamos de estar estáveis, não chega arranjarmos soluções financeiras. Acredito nas medidas que estão a ser feitas.
R: A falta de estabilidade tem sido ‘o’ entrave para a seca de títulos?
TM - Tem, basta olharmos para a história do Sporting. O Sporting tem sido muitas vezes adversário de si próprio. E não pode ser.
R: Bruno Fernandes encaixa no perfil de capitão de equipa?
TM - O Bruno lidera pela acção. Já o ouvi a discursar internamente e fiquei maravilhado com a forma sentida e genuína como o fez. Tem características de liderança muito especiais e particulares. É um grande exemplo para quem está nesta casa e espero que fique muitos anos. Sei que é um investimento financeiro grande, mas do ponto de vista humano o que colhemos é maior do que esse factor.
R: Marcel Keizer tem mesmo, no seu dia a dia, a moderação que apresenta nos relvados?
TM - Sem dúvida. Temos de o respeitar por nos vir ensinar que podemos ser líderes desportivos de alto rendimento mantendo uma postura correcta. Do que vi, é um bom líder com grande capacidade de gestão emocional. Tiro-lhe o chapéu.»
Uma excelente entrevista com os condimentos necessários e suficientes para ajudar o grande universo sportinguista a compreender o presente e a perspectivar a fundamental responsabilidade que o futuro lhe exige, se estiver disposto a contribuir para a incontornável mudança cultural que é e sempre será a semente essencial do êxito.
Tomaz Morais poderá vir a ser a pedrada no charco de que há demasiado tempo o Sporting Clube de Portugal necessitava para compatibilizar a sua grandeza no passado, com a sua ambição no presente e, ainda mais, no futuro. Será, como o próprio afirma, um "trabalho invisível" e que naturalmente, como Roma e Pavia, nunca poderá ser feito num dia, nem os seus objectivos alguma vez poderão ser alcançados sem a adesão, comunhão e participação de todos os sportinguistas.
O Sporting não pode continuar a ser adversário de si próprio!...
Leoninamente,
Até à próxima
Excelente profissional. Talvez das melhores contratações feitas pelo nosso clube .Vem trabalhar numa área há muito deficitária. Só espero que os micro poderes instalados no nosso clube não o afastem como fizeram a tantos outros. Forte abraço a todos os sportinguistas .
ResponderEliminar