POIARES MADURO: «BRUNO DE CARVALHO TERÁ DE SOFRER AS CONSEQUÊNCIAS» (LINK)
Eis a entrevista concedida ao jornalista Ricardo Granada e hoje publicada ano jornal Record. Vale a pena ler:
«Foi por sentido de missão que o professor universitário e ex-ministro, de 49 anos, se chegou à frente para "ajudar" o seu clube. Não será candidato, mas já viu os ‘bastidores’ quando presidiu ao Comité de Governação da FIFA.
RECORD
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Prestou apoio jurídico à Mesa da Assembleia Geral, de Jaime Marta Soares, no litígio com o Conselho Directivo, então liderada por Bruno de Carvalho. Porquê?
POIARES MADURO – Porque entendi que o que se estava a passar era extraordinariamente grave. Na medida em que se pudesse fazer uma contribuição positiva e ajudasse a restaurar a normalidade no clube, que o devia fazer. Quer pelas competências jurídicas que tenho, quer pela visibilidade pública em função de funções anteriores. Queria ajudar o meu clube.
R: Na altura não temeu que os sportinguistas achassem que estava a escolher um lado?
PM - O meu lado sempre foi o do Sporting. Não foi nem o lado da Mesa da Assembleia Geral nem do Conselho Directivo. Achei que a MAG era quem estava a defender os princípios fundamentais da organização democrática do clube.
R: Era evitável que este assunto chegasse à barra dos tribunais?
PM - Era evitável se a direcção se tivesse demitido; infelizmente, isso não ocorreu. A única forma de garantir o cumprimento dos estatutos e a lei foi recorrer aos tribunais. Teria preferido que assim não fosse, mas infelizmente foi a única alternativa que o dr. Bruno de Carvalho e restante CD deixaram.
R: Esteve na AG de destituição? Se sim, sentiu-se intimidado?
PM - Estive. Foi preocupante ver milhares de adeptos em filas, silenciosamente, enquanto outros utilizavam linguagem violenta que não permitia sequer que se defendesse um ponto de vista contrário. É importante ter sensibilidades diferentes, incluindo os que continuam a rever-se nas políticas da ex-direcção. Vi ofensas gravíssimas, sem provas, serem feitas aos membros da MAG.
R: O Sporting tem, agora, eleições marcadas em Setembro. Planeia avançar com uma candidatura?
PM - Não é concebível ser candidato nesta altura, por duas razões. Uma de natureza institucional, dado que defendo um modelo de governação diferente, que distinga claramente o presidente do clube e da SAD. A segunda é prática, por hoje exercer funções em Florença e, portanto, não ser viável alterar a minha vida profissional de um momento para o outro. Poderia, daqui a uns meses ou um ano, voltar a Portugal, mas o Sporting não se compadece com a hipótese de poder esperar. Espero bem que o Sporting venha a ter um presidente que nos dê imensas alegrias, que não me faça sequer ponderar no futuro, independentemente de poder ou não estar disponível.
R: Ou seja, no futuro pondera afastar-se da política e dedicar-se à área do futebol?
PM - Da experiência que tive no Comité de Governação da FIFA, reparei que a cultura dominante não me permitia implementar as reformas necessárias. Era uma preocupação que teria, se exercesse funções no Sporting, perceber até que ponto seria uma vantagem para o meu clube eu entender que o futebol precisa de reformas profundas quanto à sua integridade. O problema é que o futebol é dominado por uma espécie de cartel político, e isso é algo que só pode ser resolvido com supervisão externa. Não é um problema que se resolve substituindo apenas a liderança. Um indicador disso é a permanência de quem dirige. Havelange esteve 35 anos à frente da FIFA, Blatter já ia em 17. Em Portugal, os presidentes estão há imensos anos. Qualquer ditador fica envergonhado perante a longevidade no poder nestes dias. Algo que defendo no Sporting é uma limitação de mandatos, de só poderem ser renovados uma vez.
R: Algum dos actuais candidatos será o ‘seu’? Pode eventualmente colaborar num projecto?
PM - Quero conhecer melhor as equipas e saber as posições que os candidatos tomam quanto a aspectos que para mim são fundamentais. Até poderei apoiar a que várias candidaturas se unam, desde que assim contribuam para um Sporting mais forte.
R: Sabe de algum nome que esteja pronto para avançar?
PM - Tudo o que tenho ouvido é público. Há imensos candidatos, talvez até de mais. Mas as pessoas são livres de se candidatar.
R: É saudável ou prejudicial haver um número tão elevado de candidatos à presidência?
PM - Podem ser ambas. É sinal de vitalidade, porque diz que há muitos sportinguistas com entusiasmo. Mas ao mesmo tempo é uma fragmentação de competências. Também não temos assim tanta massa crítica para que nos possamos dar ao luxo de a dispersar por 10 ou 15 candidaturas. Seria importante juntar essas competências em pelo menos uma ou duas candidaturas fortes, que tivessem condições de prosseguir um projecto assente na mudança do modelo de governação.
R: Por estarem suspensos, Bruno de Carvalho e Carlos Vieira devem ser permitidos ir a votos?
PM - Qualquer democracia funciona de acordo com as regras, que definem quem está ou não em condições de poder ser candidato. Defendo o cumprimento escrupuloso dos estatutos. Estão sujeitos a processos, vamos ver qual é a decisão a aplicar.
R: Entende a suspensão preventiva aplicada pelo Conselho de Fiscalização?
PM - Sim. O que está em causa é grave. Tratou-se de violar as competências de órgãos eleitos pelos sócios e de tentar criar órgãos não previstos estatutariamente. Quanto à decisão que vai ocorrer, não me vou pronunciar. Devemos proteger ao máximo a independência dessa comissão.
R: Nas eleições de 2013 e 2017, foi apoiante de Bruno de Carvalho?
PM – Não apoiei ninguém. Era um sócio silencioso, como muitos, simplesmente apaixonado pelo Sporting e sócio há muitos anos. Não pertenço nem a ‘croquetes’, nem a 'rissóis' nem a nenhum tipo de alimentação desportiva.
R: Olhando para trás, Bruno de Carvalho foi a melhor opção?
PM – Acredito que Bruno de Carvalho é um apaixonado pelo Sporting. E acredito que ele achou que o facto de ter um grande apoio dos sportinguistas justificava assumir um poder absoluto, com consequências que se revelaram desastrosas. Nenhum poder absoluto é bom. O que se passou demonstra-nos a importância de temos um modelo de governação que impeça quem quer que seja de assumir esse poder absoluto e tentar fazer o que ele fez, de violar normas estatutárias e princípios fundamentais do clube. É um comportamento típico de alguém que pode fazer tudo. O clube deve estar sempre na mão dos sócios.
R: Comentou, na televisão, a crise do Sporting e logo de seguida Bruno de Carvalho acusou-o de dizer uma "data de disparates". Esperava aquela reacção?
PM - Não. Que o que disse não foram disparates, veio a ser confirmado de seguida pelos tribunais. Eu quero participar no Sporting, mas não quero meter-me em lutas na lama, não é positivo para o clube. Ele próprio já veio reconhecer que o seu comportamento teve muitos aspectos inadequados. Acredito na capacidade de redenção de qualquer pessoa e também que os comportamentos têm consequências, e ele vai ter de as sofrer.
R: A seu ver, por que é que o anterior CD não se demitiu?
PM – Não vou especular. Apenas me parece óbvio que foi muito negativo para o clube não se terem demitido. Se o tivessem feito, provavelmente não tínhamos rescisões de nove jogadores, o que deixou o clube numa situação negocial difícil, e não estaríamos a preparar uma época desportiva quase à última hora.
R: As crises governamentais são comparáveis à crise do Sporting?
PM - Tudo o que cria instabilidade é negativo num processo de governação, aconteça ela num país, num clube ou numa empresa.
R: Como jurista, compreende os motivos evocados pelos atletas que rescindiram contrato?
PM – É preciso distinguir duas coisas. Aquilo que se passou na Academia é grave e podermos criticar o comportamento do então presidente em relação aos jogadores. Facto diferente é esse comportamento e o que se passou ser suficiente para rescindir. Tenho sérias dúvidas que venha a justificar-se a justa causa, à luz da jurisprudência da Câmara de Resolução de Conflitos da FIFA e do Tribunal Arbitral do Desporto.
R: Em parte devido a isso, esta época será muito mais difícil?
PM – Depois de tudo o que se passou, seria falso dizer que o Sporting não parte atrasado. A minha esperança é que esse obstáculo possa constituir um factor de motivação. Podemos chegar em 1º.
R: Peseiro, Nani, Beto. Temos assistido a vários regressos. É uma boa estratégia?
PM – É importante ter identidade. Para garantir isso, é preciso ter referências da história do clube.
R: Foi convidado para integrar a Comissão de Gestão?
PM – Nunca direi aquilo para que fui ou não convidado. As pessoas que foram escolhidas foram as melhores. O dr. Torres Pereira é uma pessoa com o equilíbrio e bom senso necessário para o exercício das funções. Faz boa dupla com Sousa Cintra, que tem a paixão pelo clube, a motivação e o conhecimento para ser a pessoa adequada nesta fase de transição. Não é fácil.
NOTAS SOLTAS:
mão pesada
"O Sporting devia ter um código de conduta imposto às claques que beneficiam de apoio. Fico feliz pela decisão corretíssima e óbvia da Comissão de Fiscalização em suspender as pessoas que invadiram a Academia"
saídas e uma incerteza
"Compreendo Rui Patrício, o que não significa que ele tenha razão jurídica. No caso de outros atletas é ainda mais claro. Com Podence ou Rafael Leão vejo como extraordinariamente improvável que lhes seja concedida a justa causa"
regresso e outros à porta
"Bruno Fernandes não se vai arrepender de ter voltado. Espero que Bas Dost e Battaglia façam o mesmo trajeto"
reformulação
"Devia estar estatutariamente previsto que o líder do clube fosse diferente do da SAD. Não permitiria uma concentração de poderes e iria aumentar o escrutínio do clube sobre a SAD"
decisão irredutível
"No Comité da FIFA, eu e os meus colegas determinámos que o sr. [Vitaly] Mutko, ‘vice’ da Rússia, não podia ser candidato ao conselho da FIFA. O presidente [Gianni] Infantino pediu-nos que mudássemos a decisão e não aceitámos. Depois saímos"
presidente ‘safo’
"De certeza que Infantino ia pagar um preço muito elevado se nós não tivéssemos saído"»
Penso ser um privilégio da imensa nação sportinguista sentir que no seu seio existem personalidades com a grandeza e a fulgurante inteligência de Miguel Poiares Maduro. Se a isso juntarmos um surpreendente jornalista como Ricardo Granada, teremos uma entrevista muito próxima da perfeição...
Está tudo dito!...
Leoninamente,
Até à próxima
Confesso ser 'agradável' ao ouvido..., ouvir MPM a falar... já quanto ao conteúdo... ponho algumas dúvidas, designadamente, ao perceptivel argumento do presidente do clube ser diferente do da SAD... mas o que, na práctica, estará por detrás dessa opinião... é que me leva a pedir reflexão profunda... Porque o facto de os poderes deverem continuar nas mãos dos sócios... se for um poder de 'uma mão cheia de... nada..." pouco relevante é... Ficamos com os problemas e os dissabores... ficarão outros com as "soluções"... e os louvores... E a separação de poderes entre os dois orgãos... poderá ser um primeiro passo para a dissociação total entre os mesmos... algo que é..., na práctica, o cerne da questão em que agora nos vemos envolvidos... Afinal, no sistema actual, os sócios mantiveram, de facto, o poder...!!! Se no futuro tivermos um político no Clube e um Poder Absoluto na SAD o que faremos...???
ResponderEliminarA questão Infantino... não a compreendo.. Então sairam porque assumiram a posição que achavam correcta... ou porque o presidente da FIFA iria 'pagar um preço muito elevado'...???? Parece incongruente... De pouco me interessa o conteúdo FIFA... mas a atitude, de um actual 'opinion maker' do universo leonino e eventual candidato futuro aos corpos socias, é que me é importante esclarecer...
Quanto ao mais... aqui e ali... aceitarei, democraticamente e sem muitas reservas a argumentação..., o que não quer dizer que concorde totalmente... (é como a jurisprudência...!!!) Fica 'claro' que foi convidado a avançar... o que quer que isso signifique, i.e., por quem??? Essa é a pergunta de 1M$???!!!
Quando os políticos interferem, diretamente, no universo clubístico, isso apenas quer dizer que os vícios, as "manhas" e o "modo de estar" dessa atividade é transferida para o "modo de viver" dos clubes. Que o meu clube não se transforme na praia de um bloco central mal amanhado.
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