O FUNERAL DO SPORTING
«Um adepto do Sporting que tenha chegado de Marte ontem à noite julga que fez uma viagem no espaço mas também no tempo. Em que ano se encontra? Estará o clube em sétimo lugar na Liga ou, um pouco melhor, em terceiro ou quarto, longe do título e atrás do Braga do Sr. Salvador? Não há gente nas bancadas do Estádio de Alvalade? Estará a equipa fora da Europa, acaso foi eliminada da Taça de Portugal?
Não, mas parece.
Quem lê e ouve os analistas em geral tem à frente um Sporting anémico, derrotado, sem soluções, sem espírito, de nervos em franja, com os raros golos a caírem do céu e onde um síndrome gripal se assemelha a uma doença gravíssima. Quiçá terminal. Eles bem avisam!
Nao tenho dúvidas que muitas das análises sobre o futebol do Sporting estão hoje contaminadas pela visão crítica que existe das recentes posições do Presidente do Clube. Bruno de Carvalho meteu se à chuva e a toda a equipa se molha.
É preciso, ainda assim, fazer a distinção e encontrar um ponto de equilibrio. Fazer a distinção significa que há análises lúcidas e acertadas e, vendo as coisas como elas são, o Sporting entra no Dragão com fragilidades que Jorge Jesus, um especialista em encontrar soluções para problemas difíceis, terá que contornar. Entra com fragilidades, mas entra para ganhar e pode ganhar.
O Porto está, sem discussão, a jogar melhor, tem evidenciado mais frescura física, apresenta um modelo de ataque continuado, com pressão alta e um certo frenesim para chegar à baliza. É assim desde o início da época, mesmo que Sérgio Conceição se tenha visto, pelo caminho, forçado a mudar algumas peças encontrando dentro de casa alternativas tão sólidas quanto nalguns casos improváveis. A prova é que os reforços de Inverno têm uma taxa baixíssima de utilização.
Quanto ao Sporting não está tao mal como querem fazer crer. Nem é mais "italiano" apenas nas últimas semanas. É assim desde Agosto. Está agora com pior condição física e tem menos soluções para desbloquear o jogo ofensivo.
As equipas de pressing constante e uma certa correria louca, modelo que Jesus implantou com enorme êxito e (alguns) fracassos no Benfica e no seu primeiro ano do Sporting, deram lugar a um modelo distinto. O Sporting é hoje muito mais "resultadista", esse palavrão usado para descrever normalmente o futebol de defesa eficaz (e não exactamente sedutor) de José Mourinho.
O pragmatismo da escolha já valeu uma Taça da Liga e fará do jogo do Dragão um encontro onde é preciso nervos de aço com pouco ou nenhum espaço para cometer falhas. O Porto entra como favorito, mas dar o Sporting como derrotado é um erro até porque - pela natureza do confronto - a questão emocional também conta muito e, nesse plano, já se viu as duas equipas têm a mesma vontade de ganhar, os dois líderes são carismáticos e os dois clubes querem muito conquistas este título.
Uma palavra final para Gelson. Com certeza que não devia ter feito o que fez. mas o momento - e a SAD do Sporting andou bem neste caso - é mais de compreensão do que de recriminação. Gelson tem um amigo, talvez o melhor amigo, numa situação muito difícil. O seu gesto custou bastante ao clube, mas foi a afirmação a plenos pulmões do valor da amizade. Teve um impacto que de outra forma nunca teria. Há vida para lá do futebol.»
(Nuno Santos, jornalista, em Ângulo Inverso)
Nem os padres faltam no funeral!...
Leoninamente,
Até à próxima