quarta-feira, 8 de maio de 2013

Medalhas do Ecletismo - Marta Valente


Gosto de basquetebol! Exultei com o regresso da modalidade ao Sporting, passados que foram estes longos 17 anos! Apoiei desde a primeira hora a iniciativa dos grandes sportinguistas que a pensaram e a concretizaram. Estou e estarei sempre ao seu lado, conforme puder e souber. É um projecto grandioso, sustentado e que se traduzirá numa das palavras mais bonitas da nossa língua: Amor! Amor à modalidade em si e ao glorioso Sporting Clube de Portugal.

Como tantas outras modalidades, o basquetebol e particularmente a vertente feminina, pouca atenção vem merecendo da CS em geral. As primeiras páginas dos jornais desportivos são a janela do que todos nós constatamos diariamente e nas páginas interiores, raramente encontramos qualquer referência ao que entenderão como "modalidades pobres". Nas televisões, esse quase ostracismo recrudesce. O negócio de uns e outros, assenta no sensacionalismo, no clubismo exacerbado e... no futebol! É uma questão cultural, que o pobre jornalismo luso nada faz para ajudar a modificar.

A modificação desta atroz pobreza cultural, talvez passe pelo admirável mundo novo que representarão tanto as redes sociais, quanto a blogosfera. Por acreditar nesse novo horizonte, neste blog que vos ofereço com a regularidade e assiduidade possíveis, tenho tentado atirar a pedra para o charco e a ideia de que hoje vos mostro o primeiro capítulo, aponta nesse sentido. Outras modalidades e outros protagonistas que tentarei escolher criteriosamente, já estarão na forja. Serão as medalhas do "meu/nosso" 7 de Maio, que talvez um dia possam significar a atribuição do prémio do mérito e da leoninidade, para aqueles que jamais deixarão os nossos "corações de leão". Serão as medalhas da raça e do sportinguismo. Serão a minha contribuição para o reconhecimento do esforço, da dedicação e da devoção de muitos e muitas sportinguistas, que fizeram, fazem e hão-de continuar a fazer do Sporting Clube de Portugal a maior potência desportiva do país e um dos maiores e ecléticos clubes mundiais.

Por razões que a força e conteúdo da entrevista que aqui vos deixo a seguir me permitirão omitir, escolhi a basquetebolista do Sporting Clube de Portugal, Marta Valente, para protagonizar a concretização da ideia e projecto que agora inicio. Com grande pena minha, ainda não tive o privilégio de conhecer Marta pessoalmente. Isso um dia acontecerá, inevitavelmente. Mas já somos amigos. O suficiente para que a ideia pudesse ser corporizada. O suficiente para um acreditar e confiar mútuo, que me orgulha e faz feliz e presumo que a ela também. Isto só poderia acontecer no Sporting. Isto só poderia acontecer - vou roubar a palavra à Marta! -, com almas gémeas!...


Marta Valente
Álamo (A) – Marta, como mulher, estudante, desportista e cidadã desta lusa pátria, será abusivo perguntar-lhe como se enquadra nesta sociedade tão politica e socialmente complexa e quais os horizontes que pessoal e colectivamente persegue?
Marta Valente (MV) - Considero-me apenas como uma simples rapariga de 21 anos que, acima de tudo, ambiciona ser feliz. Preocupo-me com as questões da sociedade actual, mas confesso não ser a jovem pró-activa que gostaria de ser, muito em parte pela questão da falta de tempo livre. Gostava de ver a mentalidade de Portugal evoluir, que não existisse preconceito nem corrupção, mas sou realista o suficiente para saber que isso não passa de uma utopia minha. Temos capacidade e valores para sermos melhores, não devíamos ser tão conformistas, pessimistas nem descontentes com tudo, mas, infelizmente, estas são características do típico português. Contudo, tenho orgulho no meu país e espero um dia vir a contribuir para o seu progresso sem ter que emigrar. Tenho como objectivos ser uma mulher bem sucedida profissional e pessoalmente, conseguindo conciliar sempre o desporto na minha vida, pois considero-o como uma ferramenta fundamental.

 A – Agora, será capaz de me fazer uma pequena radiografia do seu percurso académico, das razões da escolha do IST, da área que escolheu, do patamar actual e das suas perspectivas profissionais, em termos de futuro?
MV - Estou a tirar Mestrado em Urbanismo e Ordenamento do Território no Instituto Superior Técnico, frequentando o 1º ano do mesmo. Escolhi esta instituição pelo seu prestígio e pela necessidade que senti em aperfeiçoar os meus conhecimentos práticos, uma vez que a Licenciatura (em Geografia e Planeamento Regional, da Universidade Nova de Lisboa) se revelou bastante teórica. Infelizmente faço parte de um extenso grupo de jovens que não sabe o que lhe espera, estando ainda um pouco desorientada naquilo que será o futuro próximo. Contudo, estou pronta para enfrentar as dificuldades que surgirem e a qualificar-me o mais que puder, de forma a enfrentar o mercado de trabalho.
 
 A – E será possível dar-me também uma perspectiva sucinta do seu trajecto desportivo, das razões da sua paixão pelo basquetebol e do envolvimento que suportou o seu ingresso no Sporting?
MV - Comecei a jogar basquetebol apenas com 5 anos no Grupo Desportivo da Escola Secundária de Santo André, no Barreiro, motivada pelo facto de o meu avô paterno e mãe terem sido jogadores e por o meu pai ser árbitro, na altura. Inicialmente era “obrigada” a ir, pois custava-me muito ter que acordar tão cedo aos Sábados de manhã e perder os desenhos animados! Com o passar dos anos o gosto e a paixão por este desporto foi crescendo, e até hoje nunca mais consegui largar. Para mim o basquetebol deixou de ser há muito tempo um hobbie e passou a ser um modo de vida. Aos 15 anos, a frequentar o 11º ano, comecei a sentir dificuldades em deslocar-me quase todos os dias para o Barreiro, não tendo tempo nem para estudar nem para estar com a minha família, e assim decidir ir jogar para o Sport Lisboa e Benfica, onde permaneci durante 5 anos. Lá fiz parte das primeiras equipas de sub-19 e sénior femininas e concretizei o meu sonho de ser treinadora, durante 4 anos. Este ano, por incompatibilidade de horários e outros motivos pessoais vi-me obrigada a procurar outras opções, e ainda bem que o fiz! A possibilidade de vir para o Sporting surgiu na primeira vez que vi esta equipa num jogo-treino contra a equipa da minha irmã, sendo que assim que as vi jogar fez-se um clique e decidi sem hesitações: “é ali que eu quero jogar!”. E assim foi, dois dias depois já estava no pavilhão de Odivelas a fazer o meu primeiro treino. Vim encontrar no Sporting exactamente aquilo que procurava, uma equipa ambiciosa e lutadora, um grupo excelente e um espírito fantástico, sem intrigas e sem competição desleal entre colegas. Nem por um segundo me arrependo da opção que tomei, sendo que este clube só veio fomentar ainda mais o meu amor pela modalidade. Orgulho em fazer parte da primeira equipa de basquetebol do Sporting após 17 anos!

 A – Em que termos o projecto que abraçou no Sporting tanto a impressionou, para afirmar, de forma que quase emociona, “…Orgulho-me de fazer parte desta equipa e deste projecto. Cada vitória, derrota, sorrisos e lágrimas, não os trocaria por nada e orgulho-me muito disso!...”?
MV - O Sporting veio revolucionar, em parte, a minha vida, não só pelas pessoas que entraram nela mas como pela dimensão que este projecto tem. Acredito que o crescimento das modalidades assenta no facto delas existirem em clubes como o Sporting. Não quero tornar-me repetitiva, mas efectivamente nem por um segundo me arrependo de jogar com este emblema ao peito, pois representa bem mais do que as pessoas julgam. As minhas colegas de equipa (e agora amigas) são incansáveis e tornaram a minha adaptação bastante fácil. A Lúcia (treinadora), o Miguel (seccionista), os dirigentes e todas as pessoas que nos acompanharam ao longo da época abraçaram este projecto de corpo e alma, e sem eles nada disto existiria. Este clube incute-nos efectivamente o espírito de família, o apoio incondicional e a capacidade de nunca desistir dos nossos objectivos. 

 A – E como explica o que, de forma quase definitiva, também afirmou, de que “…não precisamos que mais ninguém venha preencher o nosso plantel, pois ele já está completo e cheio de alegria…”? Isso significará que rejeitará(ão) qualquer ajustamento futuro ou terá querido significar apenas uma crítica ao expediente utilizado pelo CAD e SLB, para este “final four”?
MV - Não lhe chamaria uma crítica, apenas não sou a favor da utilização de atletas exclusivamente para o final das competições ou apenas em jogos importantes (como acontece em muitos clubes pelo país fora), pois penso que só vem denegrir a verdade desportiva. Contudo, não foi feita nenhuma ilegalidade e qualquer equipa se encontrava no direito de o fazer, até mesmo o Sporting. Fico somente feliz por termos mantido a equipa e os “trunfos” que nos mantiveram na competição ao longo de toda a época, não tendo optado por esse tipo de via.

 A – Será capaz de traduzir os sentimentos que de si se apoderaram naqueles minutos finais do encontro com o CAD, em que com a vitória nas mãos, a deixaram fugir por entre os dedos, com se de areia muito seca se tratasse, que quanto mais se aperta mais nos escapa por entre os dedos?
MV - Não tenho palavras para descrever o que senti naquele momento, naqueles 50 segundos em que a vitória nos escapou literalmente entre os dedos.. Confesso que inicialmente senti tristeza misturada com raiva, como se ali tivéssemos atirado para o chão uma época inteira de trabalho. Mais tarde, depois da conversa no balneário antes do jogo de Sábado arrependi-me da revolta que sentira na noite anterior, e compreendi que não são as vitórias que fazem com que as épocas valham a pena. É evidente que contam e teria sido uma enorme felicidade arrecadar uma vitória naquele dia, mas depois de terminados os 40 minutos, o importante para a equipa era ter a capacidade de o superar. Posso afirmar que se no início do ano já soubesse que iria perder aquele jogo, teria escolhido à mesma esta equipa para fazer parte deste meu ano. Esse jogo não nos desprestigiou, e foi também nisso que nos agarrámos ao longo da final four.
A – Ultrapassada a tristeza que este “final four” representou para o grupo, qual a dimensão do horizonte que já todas segredaram entre si e certamente partilharam com Lúcia Gomes?
MV - Não considero esta final four como uma tristeza, acho que só nos veio tornar mais fortes como grupo e como jogadoras individuais. Certamente saímos com a sensação de que poderíamos ter feito melhor, mas todas sabemos que demos o nosso melhor no momento, e é isso que conta agora. O horizonte não lho consigo definir, mas posso dizer-lhe que depois destes três dias intensos de basquetebol, só espero ansiosamente pelo próximo treino e por poder estar com elas outra vez. E é nisso que penso agora! O futuro, logo se verá.
A – Se estivesse no lugar de Lúcia Gomes e apenas tivesse que ter em conta o valor de todo o plantel de que faz parte – nada de lesões e considerando todas no pico da sua forma – qual o cinco inicial que escolheria?
MV - Não escolheria, para além de esse não ser o meu papel, confio a 100% nas escolhas da minha treinadora e sei que as suas opções de cinco inicial variam tendo em conta as necessidades de cada jogo. A mim cabe-me jogar e dar o meu melhor dentro e fora de campo. Essas decisões difíceis, deixo-as à Lúcia! 
A – Qual será, na sua opinião, a mais valiosa basquetebolista do plantel do Sporting? E qual de entre todo o plantel colocaria no primeiro lugar, pelos dotes de carácter e humanismo?
MV - Na minha opinião temos claramente quatro jogadoras que fazem a diferença individualmente na equipa, sendo elas a Marisa David, a Ana Cunha, a Joana Claro e a Djeniffer Monteiro. Todas elas diferentes na personalidade e no modo de jogar, mas penso que é isso que as completa quando entram as quatro em campo. Não consigo destacar uma, principalmente por partilhar um carinho especial pela Marisa e pela Cunha que me conhecem desde os 5 anos, mas também pela Joana Claro que é, para mim, um exemplo a seguir enquanto jogadora. Por outro lado a Djeniffer “ganha” em termos de pontos de valorização ao nível da estatística e é, provavelmente, a jogadora que mais evoluiu durante esta época. Tendo em conta o carácter e o humanismo colocaria as 14 no topo, pois temos a sorte de ter um grupo muito forte nesse aspecto.
 A – Será capaz de explicar o sentido da expressão “gémea” que utiliza com inusitada frequência, em relação a algumas das suas companheiras?
MV - Utilizo essa expressão com a Joana Claro pois é frequente que as pessoas nos confundam, supostamente por sermos parecidas fisicamente. Até em jogo, já cheguei a marcar pontos e a ouvir “boa Joana!”. A nível de personalidade temos algumas semelhanças, e tal como já referi, para mim ela é um exemplo e o tipo de jogadora que eu gostaria de ser. A expressão “gémea” manifesta essa identificação e até adoração que tenho com e por ela. 
A – Agora que conhece em substância o projecto autónomo da ABSCP, o que se lhe oferece dizer sobre o apoio recebido pelo Clube? Será o adequado, o possível ou poderia/deveria melhorar?
MV - Pelo clube em si, instituição que é, penso que o apoio poderia ser maior. Todavia, compreendo que representamos o início de uma modalidade e num período de crise financeira, sendo muito difícil apoiar como desejável. Mas para mim quem faz os clubes são os adeptos/sócios, e quanto a isso só tenho coisas boas a apontar. Tenho um forte apreço pela claque e por todas as pessoas que se deslocaram semanalmente até aos nossos jogos. É por isso que o Sporting é diferente! Pelos pavilhões que já passei (e não foram poucos!) nunca assisti a um apoio tão incondicional como o dos nossos apoiantes, e cheguei mesmo a sentir-me emocionada nesta final four, em alguns momentos, com as suas palavras de incentivo após as duas derrotas. Aproveito aqui para agradecer a todos os que acreditaram em nós, mesmo depois do primeiro jogo, a todos os que se deslocaram ao pavilhão, mas também àqueles que por algum motivo não o puderam fazer. Um muito obrigada pelas vossas palavras, porque, pelo menos a mim, deram-me bastante força!

 A – Finalmente, diga-me Marta, quais são os seus sentimentos em relação ao projectado e tão desejado pavilhão João Rocha?
MV - Considero fundamental para o Sporting e para os seus atletas a construção do pavilhão, sendo que as modalidades (todas elas, não apenas o basquetebol) o merecem. É muito importante que o clube aposte na melhoria das condições de treino dos seus atletas em geral. A meu ver, deverá ser uma das medidas prioritárias neste momento.

Consegui resistir à tentação de traduzir neste "cesto" final, a emoção e a admiração que as palavras de Marta Valente em mim provocaram. Aqueles que tiverem o privilégio de por aqui passar, terão certamente a oportunidade de comungar dos meus sentimentos e avaliar o tipo de cimento com que se vai em cada dia construindo a grandeza do Sporting Clube de Portugal.

Sem porventura o supor ou sequer pretender, Marta Valente definiu a sua grandeza como jovem mulher e enorme desportista. Trouxe-nos indicadores seguros sobre a incerteza e preocupações que em termos de futuro recaem sobre a geração a que pertence. Sobre a importância e o papel do desporto e do basquetebol em particular na formação dos homens e mulheres de amanhã. Sobre a solidariedade e companheirismo que encontrou no Sporting, que mudaram a sua vida e lhe trouxeram uma felicidade que não esconde. Sobre o respeito, valores e horizontes que o grupo a que pertence cultiva e vai colocando a si próprio de forma tão natural e sã.

Obrigado Marta Valente. Dê por mim um abraço leonino, forte e reconhecido a toda a Associação de Basquetebol do Sporting, sem esquecer uma única ou único que seja. Continue a ser a grande mulher que nos mostrou a todos. Acredite num futuro melhor para si e toda a sua geração. Seja muito feliz!!!...

Leoninamente,
Até à próxima

 

2 comentários:

  1. Álamo e Valente

    Foi um prazer, e um orgulho, ler esta vossa conversa.
    Obrigado e parabéns.

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  2. Pela parte que me toca, obrigado amigo "8"!...

    Um grande e leonino abraço.

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