Os 12 (ou infinitos) trabalhos de Rúben Amorim
A psicóloga de performance Ana Bispo Ramires escreve sobre o percurso de Rúben Amorim no Sporting e na Liga portuguesa, associando-o à cultura desportiva em Portugal
«O percurso de Ruben Amorim na Primeira Liga alimenta desde há muito as parangonas dos jornais. Dos primeiros passos dados no Sporting de Braga, onde começou a “dar os ares da sua graça”, evidenciando que não estaria a tentar “sobreviver” na liga mais competitiva em Portugal, mas sim com vontade de deixar o seu cunho e marca. Até aos dias de hoje, muitos tem sido os episódios e, em boa verdade, as “provas superadas”.
Do trajecto no Sporting de Braga, resultou a curiosidade e aposta do actual clube, o Sporting, que, reconhecendo um lote de características que poderia beneficiar o projecto desportivo do mesmo, acabou por investir num recém-chegado (treinador) à Liga profissional.
A entrada no “lote dos 3 grandes” clubes traz, invariavelmente, maior (não necessariamente melhor) visibilidade a quem por lá se aventura. Em boa verdade, haverá, muito possivelmente, muito poucas profissões/funções passíveis de tão intenso e dedicado escrutínio público (e consequente desgaste) – seja da parte de reconhecidos (e legítimos) especialistas, da parte de quem quer ser muito “visto” como especialista ou da massa de adeptos em geral.
De facto, esta função beneficia de um “selo de garantia” inferior a um simples “iogurte”, na medida em que as competências parecem precisar de “validação semanal”, caso contrário, passam com enorme rapidez à condição de “descartáveis” – a título de exemplo, há pouco menos de uma semana apontava-se o “descontrolo emocional” do SCP na imprensa e, há um par de horas, assinalava-se o “feito histórico” que poderá estar perto de se alcançar (ultrapassar as 29 jornadas sem perder, feito este detido por Fernando Vaz).
Uma verdadeira montanha russa.
Factualmente falando, o que é certo é que a legitimidade de, à data, ter alcançado 29 jornadas sem perder já não é passível de ser retirada a este profissional, por muito inflaccionado que, intencionalmente ou não, possa vir a ser qualquer “desaire” que surja entretanto.
Factos são factos e a sua liderança está, em boa verdade, mais do que validada. Independentemente do escrutínio publico que lhe possa ser feito a cada jornada – por muito que o queiram transportar para um cenário similar ao de “Hércules”, precisando validar a sua competência a cada semana - e mesmo depois de ter visto a sua credibilidade questionada desde o início no que respeita à sua capacidade para conduzir uma equipa de Primeira Liga, o que assistimos semana após semana é o exercício claríssimo de uma liderança bem-sucedida.
Os “setbacks” (ou percalços) não são só inevitáveis como são, em boa verdade, desejáveis. Todo e qualquer líder sabe que são momentos, por excelência, de construção e consolidação pois, dominando as variáveis que impactam o desempenho de uma equipa (internas e externas à mesma), são oportunidades únicas de revitalização e re-energização para o que pode ser considerado uma “recta final” de um ciclo.
Um verdadeiro líder não os deseja, mas também não os teme... antes os instrumentaliza para levar a sua equipa para patamares superiores. E, possivelmente por essa razão, Amorim oportunamente terá comentado que “os adeptos precisam aprender a sofrer”... na realidade, mais concisamente, o que eles precisam mesmo é de “crescer”!
E, aqui, e quando falamos de “adeptos” podemos (e devemos) considerá-los sem cor ou emblema, pois é de facto uma necessidade que atravessa não só toda a cultura desportiva, mas mais lamentavelmente, todo o tecido da nossa sociedade.
Crescer implica saber dedicar-se por tempo prolongado, saber resistir à frustração que advém dos resultados imediatos que não desejamos (tolamente, pois transportam informação imprescindível ao salto para a consolidação de capacidade), saber tolerar a dor física e emocional e, aqui sim, massa associativa e sociedade em geral precisam aprender muito com quem, por opção e dedicação, escolheu ser o orgulho de muitos.
O desporto é e será sempre um terreno fantástico onde podemos observar e estudar a disfunção, função e excepcionalidade do comportamento humano e, por essa mesma razão, antes de criticarmos quem por lá anda, mais certo seria tentar perceber o que aprender com ele e, ainda mais, nos congratularmos pela expressão de capacidade e inevitável notoriedade de mais um cidadão português.»
Psicóloga de Desporto e Performance
Uma curiosa e muito interessante análise à "explosão" de Rúben Amorim como treinador de futebol em Alvalade, explorando e quase esgotando todas as vertentes da sua meteórica ascensão e, convenhamos, da sua bem próxima e quase inapelável consagração no futebol português. Quer-me parecer no entanto que, ou a obra, intencionalmente, não terá sido acabada e aguardará o "fecho da abóbada" para depois do Sporting, eventualmente, se sagrar campeão, ou ficará para sempre como "capela imperfeita"! Porque muito interessante seria a autora deste excelente trabalho interrogar-se, também, sobre a possibilidade de Rúben Amorim estar ou não sempre condenado ao sucesso, se longe de Alvalade, com todos os seus defeitos e virtudes e respaldado por uma estrutura diferente daquela que encontrou no Sporting, muito particularmente representada, pelos valores e princípios perseguidos por Frederico Varandas e sempre em declarada rota de colisão com tudo o que de mau vem inundado o nosso futebol há décadas e, muito particularmente, no momento actual...
Quero crer que, conhecendo-se hoje Rúben Amorim como não nos tinha sido dada a oportunidade de conhecer antes, talvez as espigas loiras, saudáveis e pujantes que o treinador do Sporting agora felizmente exibe, não existissem caso o jóio inundasse a seara em que a fortuna o resolveu semear!...
Talvez não!!!...
Leoninamente,
Até à próxima
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