quarta-feira, 16 de novembro de 2016

Que os deuses guardem Rui Dias por muitos anos!...


NEYMAR REINVENTOU O SAMBA


«O futebol será sempre cultura, porque a ele corresponde um modo de ser, uma sensibilidade, um estilo e uma história. Por isso os povos exigem que os jogadores actuem de acordo com a sensibilidade e a estética dos lugares onde nasceram, cresceram e se fizeram homens; por isso desconfiam quando a proposta colide com esses valores identitários, às vezes mesmo quando ganham. O problema é o crivo do tempo que avançou para a uniformização. O Brasil, berço de alguns dos mais extraordinários futebolistas de sempre, começou por aceitar as regras do negócio (alimentou a loucura dos magnatas europeus, que foram perdendo a cabeça pelos tesouros silvestres oriundos do outro lado do Atlântico) e subverter, a seguir, a lei natural das coisas (trazê-los de volta, domados no talento, no instinto e na imaginação). 

A selecção brasileira adulterou o código genético. A reserva espiritual do futebol que, nas últimas seis décadas, logrou vitórias grandiosas (desde logo cinco títulos mundiais) sem renunciar a elementos que lhe correm nas veias como alegria, sonho e criatividade, convenceu-se de que a glória dependia não da magia mas de controlo, intensidade, organização, disciplina e sentido táctico. Há muito que os seleccionadores canarinhos lutam convictamente por formar equipas estritas, fiáveis, organizadas, de corte europeu; exércitos que sendo compostos por soldados sublimes estejam aptos a manejar valores italianos, alemães ou ingleses. 

Neymar é o motor de arranque de um ciclo que está a devolver o Brasil às origens e é herdeiro de uma dinastia rara de tão grandiosa: culmina 70 anos de história, iniciada em Leónidas e que prosseguiu com Didi, Garrincha, Pelé, Zico, Romário, Ronaldo, Rivaldo, Kaká e Ronaldinho Gaúcho. Neymar chegou a Barcelona como cavalo selvagem magistral e a escola de Camp Nou não lhe cortou a liberdade, antes ensinou-o a utilizá-la; nunca pretendeu alterar-lhe o perfil, apenas o educou dando-lhe inteligência. Iniciada a quarta época ao lado de Messi e companhia, tem a dimensão de um Bola de Ouro. Aliás, já visita com regularidade o patamar divino de CR7 e Léo, onde se prepara para viver sozinho, seguindo o curso natural do tempo – tem apenas 24 anos, contra os 31 de Ronaldo e os 29 de La Pulga.

Mas para reinventar o samba conta ainda com o apoio de duas peças fundamentais: Philippe Coutinho e Gabriel Jesus. O maestro do Liverpool, também aos 24 anos, é a prova de quem interpretou os ensinamentos da universidade europeia: adaptou talento natural às necessidades mas recusou contribuir para a estatística de um país que vende diamantes valiosos às grandes ligas europeias para depois importar, através desses mesmos jogadores, a ideia repressiva que retira brilho ao futebol sumptuoso que o identifica. Coutinho é protagonista de um grande espectáculo mas sabe que está no meio de um jogo; sendo genial, aprendeu a ser pragmático e a valorizar o resultado. Gabriel Jesus é um extraterrestre que, em breve, será fenómeno à escala planetária. O menino de 19 anos que o Palmeiras vendeu ao Man. City por 32 milhões de euros é a peça final de uma equipa que pode dominar o futebol mundial nos próximos anos.

O novo escrete, liderado pelo génio arrasador de Neymar, que já contagiou os milagres genéticos que são Coutinho e Jesus, está a recuperar cumplicidades universais geradas por fantasia, talento, paixão, aventura, elegância e até alguma irresponsabilidade. O Brasil de Tite remeteu para a génese; recriou a dinâmica e travou a delapidação do tesouro em forma de estilo assombroso que levou décadas a construir e a consolidar. Os 3-0 à Argentina de Messi, as seis vitórias nos últimos seis jogos e a exaltação do povo à volta de um dos seus patrimónios mais valiosos (o futebol e a selecção) são um bom indicador do que aí vem. 

Antes e depois de Quaresma

Quaresma levou longe de mais a expressão do talento e a influência do seu futebol genial na Selecção. De tal forma que pode dizer-se, mesmo com algum exagero, que se Portugal bateu a Letónia por 4-1 a ele o deve. Houve um jogo pastoso e sem soluções até ele entrar em acção e outro feito de esperança e soluções mágicas depois de ele entrar. A bênção é Harry Potter sentir-se confortável a sair do banco. 

A diabolização de Herrera

Herrera foi diabolizado no último clássico quando, na compensação, tentou ganhar um pontapé de baliza e ofereceu um pontapé de canto. Desde então, muitos abordaram o jogador mexicano como se este, em acto tresloucado, tivesse agarrado a bola com a mão na grande área e provocado um penálti. Nesse jogo, o Benfica beneficiou de nove cantos e os oito anteriores acabaram em nada. É só para enquadrar.

Rúben Semedo pronto a avançar

Rúben Semedo já deu sinais mais ou menos seguros de que será o primeiro elemento a alargar o número de centrais da Selecção Nacional. Porque é ainda muito jovem (22 anos) tem sido afectado, aqui e ali, pela imaturidade traduzida em alguns erros de avaliação e intervenção no jogo. Fernando Santos continua a deixá-lo sob as ordens de Rui Jorge. Enquanto tiver Pepe, Fonte e Bruno Alves faz ele muito bem.»
(Rui Dias, De Pé para Pé, in Record)


É um privilégio ler as crónicas de Rui Dias! Claro que o gozo é meu, o blog também e eu apenas pretendo deixar por aqui aquilo que sou, sinto e penso! Mas os textos de Rui Dias, do senhor jornalista Rui Dias, chegam por vezes a comover este vosso escriba e velho amigo!...

Eu amo o meu Sporting e serei uma espécie de coruja em relação aos filhos que ama estremecidamente: quem o feio ama bonito lhe parece! Mas apesar do meu oftalmologista me ter receitado há uns anos óculos progressivos, eles continuam em protesto comigo, no fundo de uma gaveta da minha secretária. Eu amo também ver o mundo à minha volta com os olhos que a minha mãe me deu! Porque há mais mundo para além do meu grande amor, o Sporting!...

Com Rui Dias tenho sempre uma certeza antes de iniciar a leitura das suas crónicas sublimes: vou conhecer mais uma faceta do belo mundo do futebol que me rodeia. Ele tem essa arte e eu fico-lhe sempre grato...

Haverá por aí quem prefira entediar-se com as "peixeiradas reles" sobre futebol que as televisões nos servem quase todos os dias. Eu abandonei "irrevogavelmente" a "paineleiragem"! Quero que vão todos para a "raiz da pata que os pôs"! Eu quero ler boas crónicas, escritas por "senhores jornalistas"! Não será preciso que o tema seja sempre futebol. Mas se for, não resisto e lá vou eu navegando nelas, com deleite e um sereno prazer... Com Rui Dias, com Miguel Esteves Cardoso, com Daniel Oliveira, Nuno Santos, até Alexandre Pais às vezes e tantos outros que agora ao correr das teclas não me ocorrem...

É por isso que o prémio Nobel ao Dylan, apanhou de surpresa tanta gente! E a morte de Brel, Mustakis, Testa ou Cohen só deixou saudade nuns quantos em que, com a lágrima ao canto do olho, me incluo. Pois é, e é por isso também que por cá os níveis de audiência à segunda à noite disparam até aos astros!...

Tudo tem uma explicação! E este arrazoado todo, simplesmente, para pedir aos deuses...

Que guardem Rui Dias por muitos anos!...

Leoninamente,
Até sempre, Sporting Sempre!...

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