Um dérbi de ideias e talento
«Sendo um desporto colectivo, a qualidade individual é a base do futebol. Durante anos as grandes equipas eram as que tinham melhores jogadores, mas o tempo acrescentou verdade tornada eterna: nada se consegue sem a coordenação de todos os elementos em jogo, o que reflecte o peso crescente de conceitos, métodos e estratégias na contribuição de cada um para a felicidade de todos. A perfeição só é possível dando homogeneidade às diferenças e tornando-as solúveis na acção.
Rúben Amorim apresentou um projecto, seguiu uma sensibilidade e respeitou os fundamentos históricos e culturais do clube; submeteu uma ideia a sufrágio, enquadrada pelo bom gosto, fê-la crescer, elevou níveis de confiança e construiu um império inesperado. À volta dele, o Sporting erigiu equipa que domina cada etapa do jogo, suas nuances tácticas e físicas; a melhor a defender e a atacar; a defender quando ataca e a atacar quando defende; cujo valor global é superior à soma das onze parcelas que a compõem. Ali, tudo obedece a um plano com sustentação metodológica; respeita a força do treino e a base científica na qual assenta o talento dos jogadores.
Aos 39 anos, Rúben triunfa por empirismo e estudo, porque credibiliza a teoria e a sustenta em permanência, com a preocupação de mobilizar os adeptos e chamá-los para o lado da equipa; por ter depurado o instinto na intervenção, através de liderança que confirma a excelência da relação com os jogadores; e porque continua a dar aulas de comunicação em cada conferência de Imprensa, sinal de que não tem pontos fracos na análise, na concepção e na intervenção. É um treinador completo. O Sporting é uma equipa sistematizada, com funções definidas, orientada por ordem apertada. Para isso, escolheu jogadores inteligentes, responsáveis e competentes, que acrescentaram espontaneidade e imprevisibilidade aos automatismos apreendidos, fazendo dos treinos aulas apetecíveis para quem nelas participa. O jogo é variado e atractivo, praticado por uma das tais equipas cuja essência é saber que a grandeza não está só em jogar por algo (a vitória) mas em fazê-lo por alguém (os adeptos).
De outra estirpe é o Benfica-2023/24, um conjunto menos atractivo, mergulhado na estranha realidade de ser posto em causa meses depois de levitar no reconhecimento unânime pela intervenção de quem trouxe inovação e poder ao futebol português. O ponto de comparação de Roger Schmidt, em impacto e influência, foi Sven-Goran Eriksson, o treinador mais marcante da história encarnada no último meio século. Exagero repetido agora, que escuta a descer os antónimos dos elogios gloriosos que ouviu na escalada para o topo da consideração nacional e até internacional.
A campanha encarnada tem sido mais sofrida, com decisões polémicas, alvo de críticas e consensos impossíveis. Mas a equipa está no topo da Liga, já conquistou a Supertaça e, eliminada na Champions, soube reinventar ilusões europeias, prova de que o esplendor pode ressurgir a qualquer momento. O Benfica vale mais pelo talento dos jogadores do que pela excelência de soluções abrangentes; ganha muitas vezes em esforço, sem entusiasmar ou servir de exemplo como equipa; é uma potência indiscutível que entra no último terço da época com assuntos pendentes, que a inferiorizam e lhe atrasam a afirmação plena.
O dérbi será um jogo entre dois exércitos de elite, que oscilará entre estilos, vocação e expressão distintas; orientado por ideias com mais ou menos peso colectivo e individual; por ordem e talento; disciplina e liberdade; responsabilidade e risco. Fará parar o país. É assim desde o primeiro dia, já lá vai mais de um século...»
Que vença o melhor futebol!!!...
Leoninamente,
Até à próxima
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