segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

Palavras para reflexão...

Entrevista de Leonardo Jardim - in Record 29/12/2014

Sete meses após trocar o Sporting pelo Monaco, o técnico madeirense recebeu Record no principado, onde nos falou da forma como superou a mudança do projecto monegasco, do respeito que conquistou e do clube leonino, onde vinca a boa relação com Bruno de Carvalho, mas alerta para a estabilidade necessária.

RECORD – No momento em que trocou o Sporting pelo Monaco e se deparou com a mudança de paradigma no projecto que veio abraçar, chegou a arrepender-se da decisão?

LEONARDO JARDIM – A minha saída foi muito ponderada. Foi positivo para todos, não é todos os dias que um clube português vende um treinador. Mesmo quando me vi confrontado com a mudança da realidade no Monaco, nunca olhei para trás, não faz parte da minha forma de ser. Tomadas as decisões, não podemos voltar atrás. Nunca me arrependi, pois estou a dar continuidade àquilo que sempre foi a minha perspectiva de carreira.

R – A sua passagem pelo Sporting, com um contrato de dois anos, foi pautada por enorme regularidade. Surpreendeu-o que os responsáveis do clube não o tenham abordado com a devida antecipação para renovar o vínculo?

LJ – É um facto que, se calhar, face aos bons resultados, podia ter-se avançado para uma renovação mais cedo, mas foi um processo que se deixou avançar até mais perto do final da época. Foi quando surgiram várias hipóteses fora do país, e aí reuni-me com o presidente, falámos sobre as coisas, e acabámos por decidir assim.

R – O Leonardo Jardim foi rendido no comando técnico do Sporting pelo Marco Silva e na altura foi público que os dois se reuniram para uma espécie de passagem de testemunho. Que mensagem e conselhos deixou, se é que o fez, ao seu sucessor?

LJ – Quando saí do Sporting, nas conversas com Bruno de Carvalho, até foi um pedido especial dele para dar tudo aquilo que tínhamos feito ao novo treinador. Procurei o Marco e procurei dar-lhe as informações em relação àquilo que era o plantel, ao trabalho que tínhamos feito, ao fenómeno Sporting. Tudo dentro de uma linha de alguém que esteve no Sporting há um ano. Basicamente, tentar ajudá-lo, de forma a que desse continuidade a esse trabalho.

R – Fala-se muito da personalidade forte de Bruno de Carvalho, com quem trabalhou durante um ano. É um presidente difícil de trabalhar?

LJ – Eu tenho tido experiências com presidentes com personalidade vincada, alguns deles difíceis de trabalhar (risos). Mas o importante é as pessoas manterem o respeito e que justifiquem a sua posição. Eu não tenho de concordar sempre com os presidentes, mas sim manter as coisas viáveis. Mas atenção, eu tenho uma boa relação com ele. Trata-se de alguém que vive o Sporting com intensidade, foi necessário no processo de mudança do clube. É um facto que tem uma personalidade diferente da minha. Ele tinha as opiniões dele publicamente e em termos de futebol eu dava a estabilidade que eu entendia que o grupo necessitava. A sua forma de ser por vezes é difícil, realmente, se não estiver em consonância com aquilo que estamos a fazer, mas entre nós houve sempre respeito. Ao longo da época eu e Bruno de Carvalho tivemos algumas opiniões diferentes, mas as nossas decisões foram sempre em prol do êxito do Sporting. As opiniões entre um treinador e um presidente nem sempre convergem, pois um presidente defende o clube e o treinador o grupo, mas há que levar sempre em consideração a estrutura. A sua presença no banco? Quando estou no jogo nem sinto a presença do presidente ou de qualquer outro factor extra-jogo. A mim não me cria qualquer problema uma realidade dessas. Nunca senti que o presidente tentasse interferir no que quer que seja. Aliás, nem me lembro de conversar com as pessoas durante o jogo.

R – Actualmente vive-se um clima de tensão nas relações existentes entre o presidente e o treinador do Sporting. Pela realidade que conhece, fica surpreendido com esse cenário?

LJ – Evito, nestes momentos, falar com as pessoas do Sporting. Com o Marco não falo desde o início da época e com Bruno de Carvalho a última vez que falei foi no sorteio da Champions. O Sporting tem as pessoas certas para resolverem os seus problemas. Mas acho que tudo aquilo que se está a criar à volta do clube não tem razão de ser. A equipa está na Taça de Portugal, fez um grande resultado no Dragão, fez aquilo que era normal na Champions – qualificar-se para a Liga Europa –, embora possa ter ficado algum amargo por não ter ido mais além. Na Liga está diferente, mais forte nos duelos com o FC Porto e Benfica, mas com as equipas chamadas pequenas está com alguma dificuldade. Aliás, a diferença para a liderança tem a ver com essa irregularidade frente aos clubes mais pequenos.

R – Por aquilo que conhece da realidade do Sporting, acredita que uma eventual saída de Marco Silva do comando técnico seria um processo complicado para o projecto desportivo do clube?

LJ – Acho que os projectos devem ser sempre do clube e não dos treinadores. Contudo, também não acho nada positiva a alteração de um técnico que, como já disse, eventualmente poderia estar melhor na Liga, mas que nas outras provas está a fazer um bom trajecto. Não vejo motivo ou razão para existir uma rutura, para despedir Marco Silva, mas estou só a falar em termos desportivos.

Leoninamente,
Até á próxima

4 comentários:

  1. Jardim terá provavelmente um carácter mais forte que MS. Como sabemos (e nesta entrevista se esquivou a referir) LJ teve conflitos com BdC que superou por duas razões: 1º - O seu forte carácter. 2º - Um desempenho de sucesso da equipa o que lhe concedia a autoridade para fazer valer as suas posições perante o presidente. Depois do presidente ter afirmado no início de época que o objectivo principal seria o título e MS não ter discordado de tal objectivo, o que genericamente se justifica (o Sporting tem em linguagem retórica sempre que assumir-se como tal) o treinador não está na mesma situação em que esteve LJ: escudado no sucesso. Repito que me preocupa o futuro desportivo do Sporting. O reequilíbrio financeiro e a sustentabilidade, embora também passem por aí, podem não sofrer a curto prazo, tão violento golpe. BdC não despediu (ainda) MS porque este não terá aceite uma verba baixa como indeminização (como BdC terá estimado), exigindo ser indeminizado em conformidade com um contrato que estabeleceu com BdC por um período de 4 anos. Não sabemos, ainda que possamos especular em função do que tem vindo a público, das razões de BdC para de uma aposta tão convicta (4 anos) ter concluído que afinal falhou e este não deveria ter sido o peão da sua aposta. Para nós, maioria de sportinguistas, não foi, nem é, claro, das razões do reconhecimento por BdC do seu falhanço (José Eduardo é nisto categórico e saberá do que fala) relativamente a MS. O despedimento de MS custaria muito dinheiro ao Sporting, o que parece ter feito recuar BdC, (para além da enorme manifestação pública de indignação dos adeptos, através dos blogs e das redes sociais (ontem à noite a SIC notícias apresentava numa sondagem telefónica uma de opinião que 100% dos que teriam respondido estariam contra a saída de MS. Arrasador.)), na sua decisão de despedir Marco. Depois do que se passou o que se pode esperar do futuro desportivo da equipa principal de futebol? Parecendo por ora insanáveis os conflitos, BdC esperará que MS não atinja os objectivos para no final da época o despedir com melhores possibilidades de o fazer por uma módica quantia? E quais são os objectivos a conseguir para que BdC os considere atingidos? É que foi essencialmente BdC a definir a meta do título como objectivo primordial, o que para muitos adeptos, como eu, seria demasiado optimismo e insuficiente realismo. Será que Marco irá aproveitar, não obstante o voto de desconfiança da tutela, para obter os maiores sucessos até ao final de época, afirmando a sua qualidade (estimulado pelo apoio inequívoco à sua continuidade manifestado pelos adeptos)? E é provavelmente isto que os adeptos esperam de Marco e seria o melhor para o SCP. E provavelmente para muitos de nós ter sucesso seria conseguir ficar no podium da liga (2º ou 3º), jogar os quartos ou as meias da UEFA e vencer a taça de Portugal. E poderá BdC considerar isto sucesso? Mais importante do que esta questão subjectiva, será a vontade de BdC de despedir ou não MS. E recuso entrar em questões relacionadas com a utilização ou não de activos contratados pelo presidente como base do diferendo, por entender que seria demasiado ridículo BdC caír nessa intromissão primária no trabalho que diz respeito à equipa técnica. Não será? Estaremos atentos e esperançados. Que o bom senso impere...

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    1. Excelente abordagem, meu estimado amigo Vitor Cruz, com a qual concordo sem quaisquer reticências! Outra coisa eu não poderia esperar, de quem viveu e sentiu, por dentro, tão fantástico e apaixonante desporto, quer como praticante de elevada craveira, quer na curta, mas intensa carreira de treinador.

      E quem algum dia ousar pensar, que a um arquitecto estão vedados os complexos segredos do futebol, a saudosa memória do arquitecto Anselmo Fernandez, bastará para defender a tese verdadeira, aquela que nos orgulhará para sempre: assinar o projecto do estádio José Alvalade, infelizmente demolido, terá sido coisa tão fácil como levar a equipa do Sporting à conquista da Taça das Taças! Os homens quando são grandes, nem precisam de se pôr em bicos de pés e sabem tocar todos os instrumentos que lhes caiam nas mãos...

      Bem hajas pela coragem do teu sportinguismo e pela tua naturalmente insuspeita contribuição.

      Um grande e fraterno abraço e fortes Saudações Leoninas

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  2. Palavras sensatas de LJ amigo Álamo, quem dera, que ele se lembrasse de ceder um pouquinho dessa sensatez ao nosso presidente....

    SL

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    1. Será mais fácil um camelo passar pelo buraco de uma agulha, amiga Leoa Maria! Mas sempre ouvi dizer que... A FÉ É QUE NOS SALVA, a nós, sportinguistas!...

      SL

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