segunda-feira, 19 de setembro de 2022

O chorrilho do Bessa não se ficou por João Pinheiro!...


Diagnóstico ao leão

«Um treinador ajuizado sabe que nunca é tão bom como lhe dizem quando ele ganha, nem tão ruim como lhe achacam quando ele perde. Um treinador maduro também tem a obrigação de enxergar que, para o adepto e mesmo para boa parte da crítica, a única equipa boa é a que ganha. Isso talvez explique alguns dos palpites futeboleiros que já se vão ouvindo e lendo por aí a contraditar de forma frontal ou mais ou menos encapotada a competência de Rúben Amorim e até de Sérgio Conceição, os dois últimos técnicos campeões. São análises atamancadas, e por vezes até boçais, de quem não entende, como diria Marilyn Monroe, que ser derrotado é frequentemente uma condição temporária – e, acrescento eu, ainda o é mais quando a liga só vai na 7ª jornada.

E a tolice é ainda maior porque, na maioria dos casos, não se releva aquilo que mais está a acentuar o aparente colapso do Sporting e do FC Porto: o Benfica tem estado a brilhar como um fio de ouro na escuridão. É o seu percurso perfeito e muito próximo de atingir registos nunca vistos que tem marcado de forma indelével o primeiro quarto do campeonato, mais do que as insuficiências dos seus principais rivais. Já aqui fomos falando do investimento e da planificação benfiquista, bem como dos méritos da aposta num treinador com as características de Roger Schmidt. De resto, devo ter sido dos primeiros, se não mesmo o primeiro, a relevar a competência, o rasgo e até a coragem e a dignidade de um técnico que consegue cativar as bancadas com um modelo de jogo atraente e ofensivo. Mas quem analisou com racionalidade os jogos do Benfica com o Casa Pia, P. Ferreira e Vizela percebeu as dificuldades que os benfiquistas também sentiram frente a equipas defensivamente compactas. E se o Benfica (que venceu quatro dos jogos pela margem mínima) tivesse perdido pontos nesses confrontos, como esteve perto de acontecer, os diagnósticos ao Sporting e ao FC Porto seriam provavelmente bem mais benignos.

Claro que, no caso do Sporting, há um detalhe que agrava em muito a sua situação: nunca uma equipa com 11 pontos de atraso para o líder (ao fim da 7ª jornada) conseguiu sagrar-se campeã. Até porque há que contabilizar também os 9 pontos de distância para o destemido Braga e ainda os 6 para o FC Porto. Ou seja, há um acumulado de 20 pontos de atraso que o Sporting precisa recuperar para os seus rivais mais directos. Mesmo tendo em conta os 81 pontos ainda em discussão, será quase como escalar os Himalaias sem garrafa de oxigénio.

O Sporting já sofreu três derrotas, tantas quantas as somadas em toda a anterior liga. Mas nem por isso Amorim deixa de ter razão quando contrapõe que os leões estão "a jogar como uma equipa grande". Claro que o técnico se refere à faceta dominadora de um Sporting que pressiona, recupera, mostra paciência na construção e teve 73,12% posse de bola no Bessa, onde foi melhor durante mais tempo, mas perdeu para um Boavista aglutinado e engenhoso. De facto, o Sporting só fez um jogo verdadeiramente mau, frente ao Chaves, porque mesmo no Dragão acabou por se exibir melhor do que o resultado (3-0) reflecte.

Após o desaire no Bessa, lá voltaram as teorias dramáticas e arrivistas sobre a falta de uma referência ofensiva, como se a aposta num trio ofensivo de grande dinamismo, destreza e mobilidade não fosse uma solução legítima e já premiada noutras latitudes. Mas não foi a jogar assim que o Sporting se estreou a vencer na Alemanha (Eintracht) e derrubou o todo-poderoso Tottenham?

O comportamento bipolar e a 'falta de consistência' para consumo interno de que fala Amorim reflecte principalmente a falta de fiabilidade e contundência defensiva no campeonato. O Sporting só consentiu 22 remates nos 7 jogos da liga, mas já sofreu 10 golos (quase tantos quantos os 13 marcados). Não é uma questão de falta de organização defensiva, antes de excesso de erros individuais cometidos por quem se apresenta menos concentrado quando a equipa não tem o grau de exigência competitiva que implicam os jogos da Champions. E convém não esquecer que o central St. Juste foi o grande investimento (9,5 M€+2,5 M€ em objectivos) para esta época e tem passado mais tempo na enfermaria do que no relvado, com tudo o que isso implicou nos posicionamentos que estavam pensados para Gonçalo Inácio e Matheus Reis.

Já se sabia que há directores de comunicação que conseguem arranjar uma discussão numa sala vazia, mas é possível que estejam agora também a aprimorar-se na arte do embuste. Foi pelo menos essa a sensação que ficou quando a ausência de Sérgio Conceição à 'flash interview' após o empate do FC Porto no Estoril foi explicada como uma retaliação ao jornalista da SportTV que questionou (de uma forma pouco hábil, é certo) Taremi sobre a expulsão em Madrid e os seus propalados dotes de 'piscineiro'. Mais uma situação de claro 'non sense', não só porque Taremi respondeu com argumentos inteligíveis às perguntas, mas também porque todos nos recordamos das outras várias vezes em que Conceição não quis saber das entrevistas rápidas…

Petit é cada vez maior

Petit já merece ser olhado com um treinador competente e detalhista. Longe vão os tempos em que irradiava principalmente o pendor beligerante que tinha enquanto jogador. O Boavista (15 pontos) está a fazer o melhor arranque de liga da sua história e tem-no conseguido com um futebol escorreito. O seu 3x4x3 privilegia o equilíbrio, as mudanças rápidas do centro de jogo e os ataques rápidos. Na baliza está agora o brasileiro César (30 anos), um ex-campeão do mundo de sub-20 que aproveitou a lesão de Bracali para se estrear e impor os seus quase dois metros. O regressado Sasso dá o equilíbrio na defesa, onde foi muito feliz a adaptação de um Reggie Cannon que exala qualidade. É jogador para outros voos, como talvez venha a ser o lateral Pedro Malheiro. Makouta garante a dimensão física do miolo e Seba Perez a gestão cerebral, a par de Bruno Lourenço, um canhoto que parte da direita para se recriar no meio, como no golo de autor que marcou ao Sporting. A profundidade é dada pelo sprinter Kenji Gorré, na esquerda. Destaque ainda para dois jovens: Bozenik (emprestado pelo Feyenoord) é um ponta de lança que pode ajudar a fazer esquecer Musa; Onyemaechi (emprestado pelo Feirense) é um Speedy González canhoto com requintes técnicos e capaz de jogar com a mesma destreza tanto a lateral como a central. O Boavista tem hoje mais 'banco' do que no passado recente, mas tem principalmente um treinador 'self made man' que soube aprender e que nunca se põe em bicos de pés.»

Os erros individuais serão a causa mais próxima e óbvia para a situação actual do Sporting e a sua "omissão ou branqueamento" da parte de Amorim, ao contrário do que o próprio possa pensar, não tem ajudado absolutamente nada, por injusta falta de expiação...

Será sempre muito difícil conciliar o sol na eira com a chuva no nabal! É forçoso que os bois sejam sempre chamados pelo nome e sintam na própria carne, ainda que "em família", as consequências das suas culpas...

O chorrilho do Bessa não se ficou por João Pinheiro!...

Leoninamente,
Até à próxima

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