quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

Só hoje o compreendi e estou grato a Rui Dias!...


William pôs tudo no lugar

"O que parecia a travagem no processo de construção de um futebolista de eleição foi, afinal, a etapa necessária para torná-lo ainda melhor. Agora, só precisa de manter o rumo para ser, em breve, uma estrela do futebol mundial.

1 É vulgar que as rotinas criem num futebolista a convicção de que já assimilou todos os princípios da tarefa e de que está apto a exercer só com os fundamentos já adquiridos. William Carvalho movimentava-se de olhos fechados pela ampla sala do centro do terreno quando, de repente, percebeu que lhe tinham mexido nas gavetas; que a roupa mudara de lugar e as prateleiras estavam desarrumadas. Marco Silva criou, desse modo, enorme desafio a um médio-centro cujo ponto de partida posicional se definia no momento defensivo. Podia faltar-lhe contundência nos duelos individuais e avaliar mal os instantes limite, em que era preciso fazer uma falta feia, dar um pontapé para a bancada ou estimular qualquer intervenção que alimentasse o trabalho sujo de que o futebol também é feito. No essencial, conhecia a cartilha de cor

2 Desempenhando a mesma função, actua agora mais adiantado numa equipa que cultiva a posse como sinal de identidade. Se antes jogava de trás para a frente, agora vê e analisa o jogo na perspectiva inversa. Sendo verdade que as novas exigências se adaptam melhor ao futebolista que é, demorou a enquadrar-se. Porque sabe jogar, gosta de ter a bola e progredir com ela; porque tem no ADN dimensão criativa para ser útil em zonas mais adiantadas e participar nas acções que conduzem à baliza adversária, William deixou-se levar pelo entusiasmo. Sem dar por isso, descurou a articulação desse desejo com a tarefa primordial que é ser o polo de segurança e equilíbrio a partir do qual a equipa depura a ordem e expressa boa parte dos seus segredos posicionais e de funcionamento.

3 Dizem os especialistas que a retirada é a mais difícil de todas as manobras militares. Transferindo a dificuldade para o futebol, quando uma equipa recua e abdica da iniciativa, o mais importante para não se expor é apetrechar-se tacticamente para não ficar à mercê do adversário. A complexidade do processo é imensa, porque a acção depende da organização que o exército for capaz de manter no momento em que perde a bola. Influenciado pela emoção, William achou que podia estar em mais do que um lugar ao mesmo tempo. Mais próximo da zona de definição, perdeu o senso comum: convicto de que podia provocar desequilíbrios ao adversário, chegou a criar o caos na sua própria equipa; seguro de que podia dar largas a devaneios artísticos acabou por desestabilizar o seu próprio colectivo.

4 O que parecia ser a travagem no processo de construção de um futebolista de eleição foi, afinal, a etapa necessária para torná-lo ainda melhor. A experiência, o sentido de orientação dado por Marco Silva e a capacidade para continuar a aprender nunca puseram em causa a construção sustentada de um grande jogador. William agregou ciência, depurou qualidades e multifacetou argumentos, de tal forma que está a tornar-se um jogador melhor, ainda mais completo e muito mais valioso para o mercado. Aos 22 anos, tem sabido gerir o impacto das exigências inerentes ao estatuto de figura maior e interpretar com inteligência cada passo de uma carreira na qual quase tudo lhe sucedeu num curto lapso temporal - Sporting, Selecção e interesse de algumas das maiores potências europeias. Já pôs tudo no lugar. Agora, só precisa de manter o rumo para, em breve, ser uma estrela do futebol mundial..."
(Rui Dias, DE PÉ PARA PÉ, in Record)

William Carvalho foi até aos últimos três ou quatro jogos do Sporting, responsável por uma das minhas grandes decepções desta época. Para com os meus botões e até de raspão por aqui, cheguei a declarar-lhe a "virose" que já destruiu tantas carreiras de meninos da nossa Academia, que os dedos das minhas mão não chegarão para contar.

Como apenas vivo o futebol com o coração e, embrenhado na ultrapassagem das dificuldades que a vida a todos impôe, não sendo eu excepção, nunca me foi facultado o privilégio da aquisição de conhecimentos suficientes para ser capaz de diagnósticos melhores que aquele que William me parecia suscitar, tenho a humildade de hoje aqui vir confessar que falhei.

E não me caem os parentes na lama, se disser que Rui Dias hoje me deu uma tremenda aula de interpretação, sobre aquela que, agora, presumo ter sido a mais importante e decisiva fase de aprendizagem e afirmação de William de Carvalho. Se tivesse saído do Sporting, no final da época passada, poderia muto bem ter passado ao lado de uma enorme carreira.

William Carvalho só daqui a muitos anos saberá quantificar a gratidão que para sempre lhe hão-de merecer o Sporting, Leonardo Jardim e... Marco Silva!...

Eu só hoje o compreendi. Estou grato a Rui Dias.

Leoninamente,
Até à próxima

2 comentários:

  1. Não sou catedrático de futebol, nem da táctica... no meu ponto de vista a análise de Rui Dias não é a correcta, é simplesmente a dele.
    Quantos e quantos jogos se ouviu já assobiar o William? Vários, não pelos "devaneios" interpretados por Rui Dias mas sim pela forma, por vezes displicente, com que (não) abordava os lances na sua area de accao. Era ver o pessoal nas bancadas com as mãos na cabeça quando, numa mudança de velocidade de um adversário, se via William a não acompanhar, não reagir, a correr ao lado e a ficar para trás até desistir dos lances...
    Não percebo o que se tem passado na cabeça do miúdo mas acredito não ser (só) o que é referido em cima por Rui Dias. Grande jogador não precisa de meia época para se adaptar a diferentes dinâmicas ou esquemas tácticos, ele que trabalhe e honre a camisola e deixe de ouvir o que empresário lhe mete na cabeça...
    É a minha opinião.
    Abraço e SL

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    1. A análise que o amigo Sandro Fino faz, também é, natuiralmente, a sua. Por mim e espero que me perdoe, acho-a demasiado simplista ou mesmo redutora. Penso que a progressiva e consolidada melhoria de William Carvalho desde o início desastroso da época, aponta mais para o tese de RD do que daquela que o amigo defende. Eu próprio fui levado a pensar aquilo que confessei no post. Hoje assisto à evolução de William novo e bem mais completo, quiçá a caminho da forma e da polivalência que o hão-de levar de Alvalade, ao encontro do que considero a coisa mais natural domundo: o império do dinheiro, ao qual o Sporting não poderá resistir...

      Mas não nos vamos zangar por termos perspectivas diferentes! É a coisa mais natural do mundo...

      Abraço e SL

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