O detonador do Sporting 2023/24
«Alfio Basile, treinador argentino a caminho dos 80 anos, não virava costas a uma boa polémica. Certo dia, confrontado com eventuais erros na formação das suas equipas, elevou a conversa para outro patamar: "Eu coloco sempre bem as minhas equipas em campo. O problema é que, quando o jogo começa, os jogadores movimentam-se e o desenho estraga-se." Fatal questão, que coloca as prioridades no lugar.
O projecto de jogo que o Sporting tem ensaiado para 2023/24 rompe com o passado e começa no posicionamento e na acção de Gonçalo Inácio, transformado em detonador de mudanças com implicações na fisionomia colectiva. GI é um jogador seguro e comprometido com qualquer papel; entende, interpreta e cumpre as instruções, porque tem qualidade técnica, visão e inteligência para fazê-lo; e possui todos os argumentos de um central, incluindo o talento para saltar linhas de pressão, pela qualidade do passe e segurança da condução.
Não está em marcha uma revolução mas alteração difícil de assimilar pela sua abrangência e complexidade – não se trata de mudar apenas uma peça, porque essa implica outras, num efeito dominó entre a defesa e o ataque. Menos mal que seja o Sporting de Rúben Amorim a promovê-las: é uma das equipas com funcionamento mais oleado do futebol português, logo mais apta a abordar evolução deste tipo. O importante agora é que os intérpretes acreditem no que estão a fazer, não prolonguem dúvidas, não se inibam e não promovam qualquer tipo de desconfiança – se é para ter bola, que a tenham; se é para jogar de pé para pé, que não procurem o espaço; se é para jogar curto, que evitem o pontapé para a frente; se é para ter quatro atrás, que não tenham três nem cinco; se os três avançados não são para jogar em largura, que joguem um mais dois pela zona central.
GI é um jogador em ascensão, que alargou influência no Sporting e se perfila como alternativa para a Selecção Nacional. Assenta em argumentos cada vez mais sólidos, dimensionados por autoridade crescente; está transformado num fenómeno físico e táctico (posicionamento e tempo de entrada aos lances; acerto quase total nos duelos, com solução para cada dificuldade, por ser rápido e ter depurado a utilização do corpo); baseia-se em argumentos técnicos que lhe conferem qualidade superior em missão defensiva e no início da construção. A relação com a bola atinge laivos de excelência, a condução é imaculada, o passe preciso, a visão ampla e o conceito global permite-lhe pensar os lances cinco toques à frente.
A ideia, testada mas ainda inacabada, versatiliza a proposta, alarga horizontes e introduz surpresa. GI é a pedra angular da nova tentativa de Rúben Amorim, pelo modo como transforma defesa a quatro sem bola em linha de três a partir do momento que inicia a construção; torna os extremos assimétricos e faz avançar o médio Pote para as costas de dois avançados de zona central – para assumir a novidade de uma dupla na frente, há Gyökeres, Paulinho, Chermiti e o próprio Trincão.
O 3x4x3 vai ser retocado e diversificado – pode evoluir para 4x4x2 ou 3x5x2. Os jogadores terão de adaptar-se a mais posicionamentos e funções, aumentando a necessidade de alargar a rede de cumplicidades entre si. Nunca uma equipa de topo foi tão ousada na proposta, com elementos cuja complexidade suscita dúvidas. Rúben está a correr riscos calculados. Se mantiver lealdade e firmeza nas convicções a única atitude sensata é renovar a admiração que o seu trabalho merece. E recordar que todos os instrumentos de trabalho já conheceram a eficácia, o êxito e até a glória na centenária e multifacetada história do futebol...»
Vamos renovar a admiração que o trabalho de Amorim merece!!!...
Leoninamente,
Até à próxima
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