quarta-feira, 6 de dezembro de 2023

Escreve quem sabe!...


«Gyökeres já era conhecido no chamado ‘Mercado de Talento’ desde os sub-19, depois de um Europeu sub-19 com uma fase final impressionante (3 golos em 3 jogos, 1 deles a Portugal), onde revelou um perfil predominantemente físico, já muito maturado para o escalão e que já o encaminhava para ligas Big 5, idealmente Alemanha ou Inglaterra.

É com naturalidade que assina pelo Brighton, que naquela altura estava a reforçar o investimento no talento emergente numa escala global, claramente numa lógica do ‘pagar para ver’.

Chega em Janeiro de 2018 e em Junho é emprestado ao St. Pauli (Bundesliga 2), com rendimento, notando-se evolução no entendimento do jogo, mas ainda agarrado a sistemas tácticos pouco flexíveis. Ou seja, seria ainda cedo para ser aposta numa Premier League.

Na época seguinte é novamente emprestado, desta vez para o Championship (Swansea), joga pouco e, em Janeiro, acaba por ir para o Coventry (também do Championship). Joga mais mas nem sempre como ponta-de-lança e, muitas vezes, como ala ou avançado interior, numa equipa com muita variabilidade táctica, que condicionava o seu rendimento como avançado de referência mas acaba por lhe dar mais soluções.

Nesta altura tinha ficado mais escondido no mercado, com um perfil ainda indefinido e algures perdido na imensidão competitiva mas nivelada por baixo do Championship. E também por isso o Coventry consegue contratá-lo em definitivo apenas por 1,2 milhões de euros.

Faz essa época de 2021/22 num patamar de rendimento já acima da média naquele contexto. Mas mantinha-se a desconfiança de um jogador ainda ‘de meio da tabela do Championship’ (ficaram em 11.º). Ou seja, o valor apercebido não encaixava na desproporcionalidade do valor de mercado que o seu clube já pedia no final da época.

Começa a época seguinte como jogador estabelecido de selecção A e integra finalmente uma equipa ganhadora, ofensiva e ambiciosa. E confirma a sua evolução em todas as dimensões, para além da física e volitiva, que já dominava, oferecendo várias soluções: no jogo directo, de apoios, de ataque à profundidade, na referência, na largura, de ataque rápido, de transição, intensidade sem bola… Tudo aquilo que já mostrou no ainda pouco tempo de Sporting.

O que aconteceu é que o Sporting fez uma abordagem muito competente e pragmática: identificou o perfil, avaliou o rendimento que projectava menor margem de erro, propôs ao jogador um projecto de valorização individual suportado por um treinador que sabe exactamente o que quer, apercebeu o valor justo naquele momento do mercado (maturidade vs. rendimento vs. retorno) e, claro, aproveitou-se do preconceito que condiciona decisões de mercado de muitos clubes, teoricamente mais poderosos (tipicamente dos Big5), que pensam poder dar-se ao luxo de ignorar alguns perfis, muitas vezes porque simplesmente podem ‘pagar para esperar’ (e ainda bem para a Liga portuguesa, que pode assim alavancar este tipo de qualidade).

É óbvio que o valor da operação não está ao alcance de qualquer clube. Mas acredito que a estratégia montada permitia (e aconselhava) essa operação.

O valor de mercado é determinado pela procura: 100 milhões de euros até podem ser curtos para o momento específico, se alguns dos poucos clubes que podem pagar realmente quiserem ir para aquele perfil.

Eu creio que o caos do calendário actual está a premiar jogadores fisicamente mais preparados e com características que os levam sempre para níveis de rendimento mais estáveis, mais evidentes ainda na especificidade da eficácia do bem mais precioso da indústria (o golo).

E o tipo de dinheiro que determina os investimentos de hoje, cada vez mais validado por um Big Data focado em acções de sucesso e dados físicos, acaba por também procurar estes perfis mais contundentes, espectaculares, intensos, fiáveis.

Nota: Eu, tal como os profissionais de mercado que dominam este contexto de talento emergente, conhecia o jogador desde os sub-17 mas não tive nada a ver com esta operação do Sporting. Tenho é de dar os parabéns a toda a estrutura, a começar pelo Hugo Viana, numa operação que muitos diriam ‘impossível’ de realizar.»
José Chieira Ex-chief scout do Sporting e FC Porto; profissional de mercado

Escreve quem sabe!...

Leoninamente,
Até à próxima

1 comentário:

  1. 25 anos, perdido no Coventry, nem titular da sua seleção era. Tantos a dormir... Ou não tinha o empresário certo... Sorte nossa. Incrível

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